sábado, 9 de janeiro de 2010

Santiago - Chile: Retornando ao Brasil

Expedição do Atlântico ao Pacífico

Parte 5

Chegamos apenas na manhã do dia seguinte em Santiago, tudo ocorreu bem durante a viagem. Foram servidas no próprio ônibus, algumas refeições pelo trajeto, inclusas na passagem, uma mordomia que não estamos acostumado no Brasil. Em Santiago, o complexo rodoviário seguia o mesmo estilo da rodoviária que estamos habituados a ver, com uma variedade de empresas alocadas no mesmo espaço.

Terminal rodoviário de Santiago

Logo após chegarmos de Antofagasta fomos procurar um lugar para deixar nossas coisas. Seguindo informações acabamos chegando em uma casa de família que alugava alguns quartos da residência, um hábito que parecia comum na região. O lugar era simples, mas o preço era convidativo e tínhamos banho quente à nossa disposição. Devidamente instalados, saímos para conhecer um pouco a cidade. Teríamos que ficar um dia na capital chilena pela ausência de linhas de ônibus para o Brasil. Na verdade os disponíveis já não tinham lugares vagos.

Em relação à passagem de volta para o Brasil, minha pretensão era pagar parcelado através de cartão de crédito pela Pluma, empresa brasileira que faz o trajeto Santiago-Curitiba, todavia, a disponibilidade de poltronas era somente para duas semanas depois, um tempo que não tínhamos. A opção foi comprar a passagem pela Chile Bus, contudo, o pagamento era somente a vista. Dinheiro que eu não tinha disponível. A sorte foi que o Aramis me emprestou a grana da passagem e ainda aceitou parcelar pra mim. Camarada é camarada. Com tudo certo, tínhamos a tarde toda para desbravar a capital, não perdemos tempo.

Santiago do Chile, como estamos acostumados a ouvir, é uma cidade enorme, digna de ser capital de um país. Como pode-se presumir, a população também é grande, o centro movimentado e um trânsito com um fluxo significativo de veículos. Na minha percepção, Santiago lembra São Paulo, no que diz respeito a região central, sobretudo, na característica arquitetônica da construção predial. Os calçadões com a presença de artistas, praças, igrejas e o ritmo das pessoas também lembram o centro da maior cidade do Brasil. Fico fascinado com a cidade, um diferencial marca a impressão sobre a capital chilena, a limpeza de suas ruas e prédios.

Estação Central

Não estava em nossos planos conhecer Santiago, seria apenas uma breve passagem. Mas como nosso embarque foi marcado para o dia seguinte, decidimos pegar o metrô e fazer um passeio. Alguns meses antes eu lecionava para os alunos da oitava séria sobre América Vermelha, como estava intitulado no livro didático, era um assunto sobre a influência socialista no continente. Entre o conteúdo, constava o período das mudanças praticadas pelo presidente chileno Salvador Allende que durante a época da ditadura sofrera um golpe de estado e fora assassinado pelas tropas do regime militar que colocou o ditador Pinochet no governo do país. Essa transição imposta marcou a história do país e do continente. E um local ficou marcado pelos acontecidos sucedidos, o palácio presidencial La Moneda, que estampava uma página dos livros didáticos dos meus alunos. Então, conhecer o local onde se passou esse importante fato da história, seria no mínimo fechar a viagem com chave de ouro.

Antes de embarcar no metrô, estávamos apenas circulando na região da rodoviária, foi quando comentei sobre a idéia de conhecermos o centro da cidade. Sem hesitar, Aramis aceita o convite e partimos em direção à estação Universidade de Santiago. O bilhete era barato e uma ilustração das linhas do metrô foi o sinal verde para seguir um caminho. Estação La Moneda. Era um local não muito distante de onde estávamos, resolvermos embarcar. Quase seis horas da noite, horário de pico, inclusive no metrô que estava movimentado, uma rotina também parecida com São Paulo. Após o desembarque, seguimos poucos metros pela calçada e lá estava ele, o palácio La Moneda.

Estación Universidad de Santiago

Metrô

Linhas de metrô em Santiago

La Moneda está cercado por diversos prédios, a maioria de serviços públicos de responsabilidade do governo. Uma área também destinada à memória dos presidentes chilenos através de bustos expostos ao redor do palácio, que por sua vez, tem na parte frontal um espelho d’água que deixa o local ainda mais charmoso. Para nossa surpresa na parte de baixo do La Moneda, existe o Centro Cultural, que leva o mesmo nome do palácio, este interditado para visitas, mas o centro cultural estava aberto ao público, fomos prestigiar as obras e seus artistas. Um espaço interessante com várias exposições e atrações de diversas partes do mundo. Ficamos um bom tempo apreciando as obras do local.

Estação La Moneda

Palácio de La Moneda, sede da presidência da República do Chile.

Arturo Alessandri Palma, presidente nas décadas de 1920 e 30.

La Moneda de outro ângulo

Centro Cultural

Centro Cultural Palacio La Moneda

Interior do Centro Cultural

Praça defronte ao La Moneda.

Outro ângulo

Monumento em homenagem à Salvador Allende

Intendencia de Santiago

Catedral

Centro

Fora do centro cultural, quando caminhávamos ao lado do palácio, uma movimentação policial chama atenção. Estavam fechando a rua para o trânsito e logo em seguida escoltando um ônibus policial, com diversas pessoas em seu interior. O veículo para por alguns instantes bem ao nosso lado, não demora muito para outras pessoas se aproximarem, inclusive a imprensa. De dentro de ônibus, as pessoas gritavam, manifestando expressões e reivindicando seus direitos. Uma mulher se destacava entre aquelas pessoas, em vários momentos mencionava que estavam – o governo – voltando para o período da ditadura de Pinochet. Foi uma cena forte, e que de alguma maneira, me fez lembrar da época do regime militar chileno, sobretudo, quando Allende foi assassinado no interior do La Moneda. A imprensa perguntou nossa opinião sobre o caso, mas informamos desconhecer o que estava acontecendo. Uma mulher ao nosso lado me explicou que aquelas pessoas eram partidárias de um determinado político que havia sido preso pela policia por algum motivo. Acredito que ao defenderem essa pessoa, acabaram presas por manifestarem sua expressão, opinião e apoio. Foi o que consegui entender. Logo depois o ônibus segue, ecoando os gritos dos presos pelas ruas envoltas da tranqüilidade aparente do La Moneda.

Presos políticos

Pelas ruas, passamos por várias igrejas, o Aramis decidiu entrar em uma delas, enorme por sinal, uma missa acontecia no momento, de toda forma, meu camarada de viagem aproveitou para agradecer. Sem religião, e há muito tempo sem entrar em igreja, aproveito a calma do ambiente para fazer uma breve oração aos deuses. Os indígenas já utilizavam dessa prática, quando eram forçados a assistirem as missas dos jesuítas, mesmo não acreditando no deus dos cristãos. Assim, eles aproveitavam a ocasião e faziam suas orações aos deuses em que acreditavam. Então, talvez estivesse agradecendo aos deuses do pedal ou da natureza, quem sabe.

O Aramis ainda passou em um supermercado para comprar algumas coisas e depois seguimos para a nossa hospedagem. Não me lembro qual foi o jantar, possivelmente os pãezinhos chileno. Deixamos tudo preparado para no dia seguinte levar as coisas até a rodoviária. Minha bike foi desmontada e colocada dentro da barraca, no mesmo esquema da volta pra casa na Travessia do Paraná.

Na manhã seguinte, dia 12 de janeiro de 2008, nos direcionamos para o local de embarque. As bicicletas e as bagagens são colocadas em um lugar especial, ficando isoladas das malas dos demais passageiros, um fator positivo, dificultando que outras pessoas tivessem acesso as nossas coisas. Nenhum centavo a mais foi cobrado pelo transporte das bikes. E o embarque foi tranqüilo, assim como o restante da viagem. A empresa Chile Bus, está de parabéns pelo serviço prestado a seus clientes. Toda uma atenção especial, refeições a bordo e um ambiente reservado para viajarmos com tranqüilidade e segurança. Aprovado.

Rodoviária de Santiago, voltando para o Brasil.

A viagem para Curitiba durou exatamente dois dias, logo que saímos de Santiago em direção à Mendoza na Argentina, avistamos o Aconcagua quase na divisa dos dois países, na região de Los Andes, onde uma imensa subida/descida marcada pela estrada em forma de Caracóis permite chegar ao maior pico das Américas, com mais de seis mil metros de altitude. Uma paisagem espetacular a uma altura incrível, o monte estava coberto de neve, sem perdermos tempo, registramos o local, mesmo dentro do ônibus.

Caracóis

Aconcágua

O regresso do Chile para Argentina foi tranqüilo no que refere-se a burocracia da emigração. Durante o caminho presenciamos várias paisagens maravilhosas de vales, rios, lagos azuis, montanhas com neve e tudo mais. No interior do ônibus o que chamou atenção da maioria foi a presença de um casal de lésbicas que sem se importar com o pensamentos daqueles que estavam ao redor, se comportavam da mesma forma que um casal, atitude que causou inúmeros comentários, alguns de modo preconceituoso, infelizmente. Aramis e eu, achávamos uma cena diferente, mas em nenhum momento julgamos suas escolhas.

Lagos.

A volta para o Brasil foi marcada por um almoço típico brasileiro, restaurante com buffet em Uruguaiana no Rio Grande do Sul, divisa com Argentina. Como estávamos morrendo de fome, mas muita fome mesmo. Aproveitamos, comemos bastante, além da conta, tudo aquilo que não havíamos encontrado no caminho durante os dias de pedal. Nem a sobremesa escapou. Devoramos tudo, claro que passamos mal depois. Não precisamos nem sair entrar no ônibus para perceber o efeito de tanta comida. Mal conseguia andar, assim que paguei a conta e sai do restaurante, me deitei na calçada em frente do estabelecimento e com o Aramis do lado, parecíamos dois mendigos. Uma cena hilária. Demorou pra comida fazer digestão, principalmente quando ainda tínhamos horas de viagem no ônibus. Mas mesmo assim não me arrependo de saborear a maravilhosa culinária brasileira.

Seguindo o trajeto do ônibus, ainda passamos pelas capitais, Porto Alegre e Florianópolis, antes de finalmente chegarmos à Curitiba no dia 14 de janeiro de 2008, onde me despeço do camarada Aramis, que tornou-se um amigo, verdadeiro camarada. Registramos a despedida em uma fotografia que demonstra bem o efeito de horas sentados no ônibus, pés extremamente inchados, no meu caso, voltaria à normalidade uma semana depois. Ainda durante a manhã seguiria viagem em outro ônibus, agora para a casa da família em Foz do Iguaçu, aproximadamente mais oito horas na estrada. Sem nenhum problema na viagem, chego finalmente em Foz. Estou de volta, mas já não sou mais o mesmo.

Rodoviária de Curitiba, despedida do camarada Aramis.

4 comentários:

  1. E o camarada João, abandonou vocês inclusive na volta para casa? Diante de todo relato, não há como considerá-lo da equipe. É uma pessoa individualista, que mesmo com os mais de 2000 Km não aprendeu a importância do pedal em conjunto e em equipe. Pois hoje ele não precisa dos demais, porém, amanhã quem sabe!!?? Aramis e Nelson sim foram companheiro. Ademais, porque combinar em pedalar juntos em tal aventura, quando na verdade João não o fez? Deveria ter ido sozinho. Talvez não foi ou não teve coragem de ira sozinho, pois precisaria do auxilio de algum companheiro. Como não precisou da ajuda durante a viagem, expôs seu individualismo,pensando no seu proprio umbigo. Parabéns Nelson e Aramis, pelo verdadeiro espírito aventureiro e de amizade, onde um não deixou o outro para traz.

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  2. Olá,

    Estou indo para o Chile e depois pra Mendoza de ônibus, comprei as passagens pela internet e quando procuro no google o terminal rodoviário aparece uns três... vc sabe me informar onde que fica o terminal de Santiago para ônibus internacional?

    Obs: Bela viagem vc fez!
    Att,
    Marcela - Maringá - PR

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  3. Nelson,

    Estou a horas lendo os relatos. Eu já conheci o Santiago/Mendoza através de mochilão, mas sinta-se responsável se um dia eu fizer um trajeto similar de bike.

    Parabéns

    Luiz Miguel (Recife)

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  4. olá, estava passeando pelo Google quando me deparei com essa maravilhosa viagem que li completamente. já faz um mês que decidi fazer uma viagem que sai de Tramandaí passando por montevidéu e Buenos aires, até Valparaíso passando por santiago de bicicleta motorizada com motor 2 tempos. se puderem me dar informações sobre cuidados e o que não pode faltar, seria eternamente grato. obs. todos dizem que estou maluco. email. jonasdsa5@bol.com.br

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