quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

A Travessia do Paraná - Quinto dia:

Travessia do Paraná - Parte 6

Saída/Almoço: Campo Largo

Pernoite: Matinhos

Distância dia: 150 km’s

Realmente eu não sabia exatamente qual decisão tomar, as horas foram passando e a fome aumentando, meu café da manhã, foi o de sempre, bolacha e água. Mas a essa altura, a lanchonete paralela ao posto estava aberta, afinal, quase onze horas da manhã. Vejo as opções para o almoço. Nada animadoras. Apenas alguns salgados fritos e inundados em gordura. Mas na estrada não se tem muita escolha e acabei comendo dois salgados.

Com o tempo bom, vou em direção a Curitiba e conseqüentemente para o litoral, na capital paranaense o deslocamento teria que ser a base de muitas perguntas até chegar à BR 227 sentido litoral. Pois logo na entrada de Curitiba, a 277 cede espaço para as ruas da cidade. E para retornar à rodovia precisei pedir muita informação.



Passava poucos minutos das onze da manhã, quando finalmente estou na entrada da capital do estado, Curitiba. Uma vitória parcial da minha aventura. À distância percorrida até aquele momento, era de 608 km’s. Mas havia muito que pedalar ainda. Logo nos primeiros trechos dentro da cidade, é notório o conceito sobre a educação dos curitibanos, embora, os mesmos também levem a fama de ser um povo ‘frio’, mais fechado. Tenho apenas a impressão de uma gente muito bem educada, para todas as pessoas a que questionei sobre qual caminho deveria seguir, todas foram muito bem educadas em explicar detalhadamente como prosseguir.

Para minha felicidade, o roteiro pelo qual sou indicado, me leva justamente para uma parte da região central, uma edificação de grandes monumentos, digna de capitais, é presente pelo caminho que vou seguindo. O trânsito na capital é tranqüilo, é feriado e aqueles que não estão em suas casas, aproveitaram para ir à praia. Desse modo, o deslocamento pelas ruas da cidade foi sem dificuldade. As surpresas continuaram, quando menos espero estou diante do Teatro Guairá, um dos mais expressivos do Paraná, sua fachada é marcada pela obra daquele que é considerado um dos maiores artistas do estado, Poty. Ao redor do teatro as edificações chamam atenção pela sua peculiaridade, um estilo pelo qual não consigo encontrar comparação para descrevê-lo. Na praça em frente ao Guairá, uma praça impecavelmente linda e organizada é motivo para fazer uma pausa e registrar o momento. Aproveito que uma moça passa ao meu lado para pedir gentilmente para tirar uma fotografia minha diante do Teatro. Agradeço a atenção e continuo pedalando pela tranqüila e bonita Curitiba, vou seguindo, conforme orientações.






Para mim, tudo era novidade, afinal, minha primeira vez em Curitiba, uma das capitais mais modernas do país, com uma estrutura urbana espelhada em países de primeiro mundo. Vou presenciando essa particularidade ao pedalar e admirar os trechos por onde vou passando. No caminho estava a Universidade do Paraná, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, atravessando a rua da universidade, uma papelaria com o xerox ao preço de sete centavos. Fiquei surpreso pelo preço e tirei uma foto da placa que indicava o mesmo. Não era pra menos, em Marechal Rondon eu e todos aqueles que necessitavam do serviço de fotocópia estavam pagando treze centavos, quase o dobro. Um absurdo.

Não demora muito para me deparar diante de um outro monumento. A Casa do Expedicionário. O interior do museu estava fechado, mesmo assim foi possível observar algumas peças e máquinas utilizadas no período de Guerras no continente europeu onde a participação de soldados paranaenses é lembrada por meio de placas em exposição na pequena praça em frente da Casa do Expedicionário, onde também é possível verificar alguns armamentos de combate, tanques de guerra e o impressionante Avião tipo P-47 D Thunderbolt, utilizado pela FAB na 2ª Guerra Mundial, como indica a informação paralela à aeronave. Fico admirado por toda a exposição, um presente para um acadêmico de história. Isso tudo proporcionado pelo cicloturismo.










Agora eu estava mais próximo da saída para retornar à BR 277, sempre seguindo as orientações dos moradores. Pego uma avenida mais movimentada, no qual não recordo o nome. Mas é aquela que passa ao lado do Jardim Botânico, este é outro ponto turístico da capital, talvez, um dos mais famosos. Não entrei para conferir a beleza do local, isso aconteceria quase dois anos depois. Mas não deixei de tirar uma foto da estufa, a principal obra do empreendimento. Eu estava mais do que feliz, era mais do que eu imaginava encontrar. E sozinho seguia agora para o litoral.




Novamente na BR 277 que atravessa todo o estado, eu estava em direção ao litoral, uma placa indicava Matinhos a uma distância de 104 km’s. Era quase uma hora da tarde, ou seja, mesmo que a quilometragem estivesse alta, não era impossível chegar ao destino, se considerarmos que eu teria a descida da serra para ajudar. Tudo apontava para que encontrasse o João, Aramis e os demais ciclistas durante a descida da serra. Como mencionado anteriormente, eles estariam no caminho oposto, subindo a serra em direção à Curitiba. Enquanto não encontro com o pessoal, vou curtindo o visual que todo esse trecho oferece. Estava pedalando em plena Floresta Atlântica, uma área de proteção ambiental. Conforme avançava com a Magrela, a paisagem ficava ainda mais espetacular e a descida da serra aos poucos ficava mais acentuada.



Não demorou muito e 15h:15m encontro o primeiro ciclista da comunidade, no outro lado da estrada, era o Aramis que estava subindo com a sua speed GTS. Ambos reconhecem um ao outro. Freio bruscamente, uma vez, que estava em alta velocidade. Deixo a bike estacionada no acostamento e atravesso a rodovia. Era um enorme prazer conhecer o pessoal que havia me inspirado e muito a colocar a bike na estrada. Naquele momento eu conheceria o Aramis, que seria um grande companheiro de viagem futuramente. Conversamos sobre a viagem e os planos para a grande Expedição até o Oceano Pacifico. Me avisa que a galera vinha logo em seguida. E não demora muito para chegar o Bruno e o João. O plano inicial pode ter sido modificado, mas encontrar todo o pessoal na estrada foi gratificante. De alguma forma, estávamos todos em treinamento para uma viagem que aconteceria nove meses depois. Converso praticamente uma hora e meia com a galera, trocando informações e reafirmando planos para a próxima aventura.



A conversa estava boa, mas eu deveria seguir viagem. Na estrada, vou descendo em ritmo alucinante a Serra do Mar e apreciando o fantástico visual que se estende por todo o percurso até o litoral. O tempo estava bom e a paisagem era o destaque, a cada trecho eu fazia uma parada para registrar as belezas naturais, os vales, a fauna e flora da região. Pedalar na serra requer ainda mais atenção de todos àqueles que trafegam pela a mesma. Os caminhões em especial, sobretudo, para os que descem a serra. A situação é igual à encontrada pela Serra na região de Guarapuava, a diferença é que na Serra do Mar, não existe as incomodas lombadas no acostamento, por outro lado, sempre quando existe um viaduto, o acostamento é inexistente, restante um pequeno trecho para pedalar. Não chega a ser um obstáculo para quem está de bike, mas é uma situação de muita atenção, pois os caminhões são freqüentes, uma vez, que está é a rota para os portos do estado.





Ainda durante a descida da serra, encontro dois ciclistas de Curitiba, amigos do João e Aramis, esses me avisaram que o Guto e Gabriel estavam em um ritmo mais tranqüilo. E sem dúvida estavam, mas também tinham problemas com uma das bicicletas. Avistando os dois parados, tentando consertar o pedal, decido parar e cumprimentar. Infelizmente não posso ajudar muito. Converso um pouco, aviso que o pessoal não está muito perto, faço um registro do encontro e sigo viagem.

Descer a serra me deixou com frio, mesmo com o sol brilhando sobre toda aquela natureza. Então sou obrigado a colocar uma blusa que me acompanhou até a chegada em Matinhos. Mas antes que isso acontecesse, ainda tive a companhia de muitos horizontes magníficos. No entanto, ficava cada vez mais tarde e a claridade se tornava menor a cada giro do pedal. Antes de escurecer totalmente e depois da descida da serra, surgem vários estabelecimentos ao lado da estrada, a maioria realizam a venda de produtos naturais, a banana é o mais visível em quase a totalidade das lojas e barracas. Como meu almoço havia sido dois salgados em Campo Largo e desde então não comi muita coisa a não ser poucas bolachas, estava morto de fome e parei para comer algumas bananas. Na verdade comi mais de uma dúzia de uma variedade menor e com o preço mais em conta. Não demorei muito no local e continuei a viagem. Agora uma sacola cheia de banana fazia parte da bagagem. Não saberia certo a que horas eu poderia encontrar um local para jantar, então foi uma forma de ficar preparado.

Escurece e mais uma vez estou pedalando. O fluxo de automóveis é intenso no lado contrário ao que eu seguia. Era a volta do pessoal que foi aproveitar o feriado no litoral. Como a BR 277 é duplicada, não tive nenhum problema com esse aumento no trânsito. Todavia, eu continuei o pedal pelas retas da 277 até a entrada da PR 407, um dos caminhos de acesso as praias, o Aramis tinha me indicado essa estrada ao invés PR 508. Contudo, a pista duplicada não continua na 407, mas o trânsito contrário é intenso ao extremo. Como estava de noite, o problema eram as luzes dos veículos em minha direção. Atenção redobrada mais uma vez, principalmente pelo fato que o acostamento tinha presente aqueles olhos de gato que servem como obstáculo para que os veículos não trafeguem pelo acostamento. Várias vezes não enxerguei esses obstáculos e passei batido, saltando a bike e quase perdendo o controle da direção.

Demorou bastante para que o movimento ficasse mais calmo na estrada. Quando isso aconteceu, me bateu uma dúvida se eu estava mesmo no caminho certo. Não encontrava placa informativa e muito menos sinal de civilização. O trecho é todo de retas e naquela ocasião parecia infinita. Estava ansioso para chegar ao destino final quando vejo algumas luzes a frente. Era Praia de Leste, finalmente litoral. Mas não localizei o mar, na verdade fui procurar informação sobre horário de ônibus para Curitiba. O que achei foi um ponto de vendas de passagem onde me informaram os horários de partida, inclusive saindo de Matinhos. Como existia ônibus para a capital somente no dia seguinte. Segui viagem para Matinhos que estava há quinze quilômetros de Praia de Leste . Estava realmente tudo muito escuro, pouca iluminação durante o caminho. E não tinha a mínima idéia para que lado estava o mar. Mas a areia em grande quantidade na estrada me fazia ter a certeza que estava mesmo no litoral.

Quase dez horas da noite do dia primeiro de maio de 2007 eu concluía com 736 km’s minha primeira Expedição. Estava em Matinhos, um dos destinos mais procurados no litoral paranaense. A sensação de chegar é indescritível, na hora parece inacreditável e realmente passa um filme na sua cabeça de tudo o que passou durante toda a viagem. Na entrada da cidade ainda encontro alguns estabelecimentos em funcionamento. Como um merecimento pela conclusão da viagem, eu parei para comer um cachorro quente, mas foi somente um mesmo. Sem dinheiro para comer outro, fique restrito ao que estava à minha condição. Conversando com o funcionário, descubro finalmente para que lado estava o mar. Para minha surpresa não estava a mais de cem metros de distância. Aliás por mais de quinze quilômetros foi essa a distâncias que eu estive do Oceano, mas como a escuridão era total, não tinha idéia. Contudo, o senhor que preparou o cachorro quente me orientou a ir até o centro da cidade e então pelo calçadão conhecer a praia. Pois o local onde eu estava era muito escuro e não muito seguro. Após comer meu lanche, fui em direção a praia, seguindo a orientação recebida.

Sem dificuldade estou caminhando pelo calçadão e sinto a brisa do mar, com a iluminação da lua refletida pelas ondas identifico sem nenhuma dúvida que a vitória da minha expedição era real. Estava diante do imenso Oceano Atlântico, havia muitos anos que não encontrava o mar. E dessa vez existia uma sensação diferente por todo o esforço para superar as dificuldades e obstáculos para se chegar onde pretendemos. Um sonho realizado a partir de uma simples bicicleta e uma força de vontade, que vai além de qualquer expectativa, é o funcionamento do seu corpo e mente em sua essência, trabalhando em conjunto para alcançar a liberdade de seguir um estilo de vida nada habitual.





Notei a presença de algumas pessoas a alguns metros de onde eu estava, então de forma rápida, aproveitei para tirar algumas fotos da praia e da bicicleta diante do Oceano. Em seguida vou em direção a rodoviária e tenho a informação que o próximo ônibus sai no dia seguinte bem cedo, acho que 5:30 da madrugada. A passagem estaria disponível para venda a partir das cinco horas. A rodoviária está deserta. A recepção, na verdade um centro de informações ao turista, tem um lugar perfeito para passar a noite, como não existia nenhum ser humano no local, resolvi deixar tudo preparado para embarcar no dia seguinte.

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