Bienvenidos a la República
Bolivariana de Venezuela!
A noite no acampamento não foi
das melhores. Para a minha infelicidade o local ficava ao lado de uma linha
férrea que ainda é bastante utilizada, sobretudo, durante a madrugada. Com o
barulho constante do trem foi praticamente impossível ter um descanso merecido.
Às 5 horas da madrugada, após ser
acordado mais uma vez, levantei e comecei a desmontar a barraca e arrumar todas
as minhas coisas para poder seguir viagem e finalmente atravessar a fronteira para
a Venezuela. Por volta das 6 horas já estava tudo pronto e voltei à estrada,
não sem antes degustar minhas últimas bolachas com geléia e rapadura.
Infelizmente meu pão havia terminado.
Desmontando acampamento às 5 horas da madrugada.
Último nascer do sol em território colombiano.
Comecei o dia com a pretensão de
chegar à Maracaibo do outro lado da fronteira. Não tinha muita certeza sobre a
distância até essa cidade, mas eu lembrava que ficava próxima da divisa. Eu nem
imaginava o quanto estava enganado.
Com o tempo bom, sem vento contra
e a temperatura agradável, rapidamente cheguei à Maicao. Seu perímetro urbano
apareceu exatamente 15 km após a saída de Cuatro Vias. A cidade não é das mais convidativas: suja e bastante barulhenta em razão do seu trânsito caótico e
infestado de motocicletas. Ainda bem que eu não precisei permanecer no local.
A movimentação intensa em Maicao
De Maicao segui direto para
Paraguachón que existe nos dois lados da fronteira, algo como acontece no Chuí
entre Brasil e Uruguai. Este último destino em território colombiano foi
alcançado em poucos minutos e logo eu estava na imigração para carimbar meu
passaporte e registrar a saída da Colômbia. Não houve fila e muito menos
burocracia. Eu estava pronto para deixar o país.
O último povoado antes de atravessar a fronteira.
Na Colômbia foram pedalados 2.315 km em 33 dias. O gasto neste período foi de aproximadamente 950 reais. A média diária de 28 reais ficou
abaixo do que havia sido planejado. Todavia, minha conta bancária está cada vez
mais magra e toda colaboração é bem-vinda para garantir o avanço da expedição.
Faça parte desta viagem, contribua. Qualquer valor faz a diferença: Conta Corrente
(clique aqui!) ou Vakinha online (clique aqui!)
Em território colombiano o que mais me agradou e chamou
minha atenção foi Ipiales com o magnifico Santuário Las Lajas; Popayán com seus
prédios antigos e diferentes das outras cidades históricas; Bogotá com toda a
grandeza e modernidade, sobretudo, cicloviária, de uma capital; Cartagena com
suas belezas naturais, arquitetônicas e históricas. Em relação ao povo
colombiano, a receptividade foi muito maior desde a capital com a incrível
hospitalidade da família Castelblanco ao encontro com os simpáticos ciclistas
ao norte do país. A gastronomia me pareceu bastante variada e saborosa. Sem dúvida é um
país que merece sua visita. Confira os últimos dias na Colômbia no tópico: Colômbia II.
Antes de atravessar a fronteira
troquei meus últimos dólares e pesos colombianos por bolívares, moeda corrente
na Venezuela. A cotação foi no chamado mercado negro onde o dólar é muito mais
valorizado do que pelo câmbio oficial. Um dólar foi equivalente a 10 bolívares.
Mil pesos colombianos correspondeu a 6 bolívares.
Com o dinheiro venezuelano em
mãos atravessei a fronteira seca. O local estava bastante movimentado e com
muitos policiais e soldados do exército. Tirei uma foto rapidamente na divisa,
mas somente depois eu percebi que havia somente a bandeira da Colômbia.
Paciência! Importante é que eu atravessei para o quinto país desta expedição
pela América do Sul.
Deixando a Colômbia para ingressar na Venezuela.
Já no lado venezuelano andei
poucos metros e fui enfrentar a longa fila na imigração. Demorei mais de uma
hora para receber o carimbo no passaporte. A demora ocorreu porque havia
somente um funcionário para atender um monte de pessoas. A maior parte daqueles
que estavam na fila eram colombianos regressando ao seu país. Os mesmos têm que
pagar 100 bolívares para deixar a Venezuela. Eu não precisei desembolsar nada para
receber a permissão de três meses, espero que o mesmo ocorra na minha saída.
Fronteira é sempre um lugar de
muitos contrastes. A divisa em Paraguachón não foi exceção à regra. Aqui a evidência
da diferente entre os dois países em questão foram ainda maiores. Em um
primeiro momento o que mais chamou atenção no lado venezuelano foram os inúmeros veículos
antigos (estilo Cadillac) e velhos, muitos, literalmente caindo aos pedaços. Um
automóvel deste tipo certamente consome muito combustível, mas isso não é
problema na Venezuela. O país é um dos maiores produtores de petróleo do mundo.
A gasolina aqui custa apenas centavos. Outra diferença está relacionada ao
horário, fui obrigado a adiantar em trinta minutos meu relógio. O fuso horário oficial está
atrasado em 2h30m comparado ao horário brasileiro.
Os primeiros quilômetros pelas rodovias venezuelas.
Chegada à Guarero e finalmente as boas vindas à Venezuela.
Ao deixar a fronteira eu descobri
que Maracaibo estava a quase cem quilômetros de distância. Não era muito, mas
eu me encontrava cansado em razão da noite anterior e precisava parar, tomar um
banho e recuperar as energias. Por isso resolvi parar na primeira hospedagem do
caminho. Isso aconteceu cerca de 7 km depois de Paraguachón quando cheguei à
comunidade de Guarero.
Guarero é um povoado pequeno e
muitos simples, contudo, oferece hospedagem. É na verdade o único hotel do
lugar, mas não deixa a desejar em nada ao das grandes cidades. A diária custou
150 bolívares. Algo em torno de 30 reais. Habitação com ar condicionado,
televisão e banheiro privado. Não era nada barato, mas eu precisava realmente
descansar e lapidar meu projeto para os próximos dias.
Após tomar banho, que estava
atrasado, fui almoçar em uma espécie de praça de alimentação à beira da
estrada. A refeição também não foi barata e o menu tradicional custou 60
bolívares. A sopa não estava caprichada, contudo, o prato principal apareceu
com bastante arroz e muita, muita carne. Fiquei satisfeito.
Antes de retornar ao hotel passei
em uma mercearia e comprei um pouco de pão (preço muito elevado) para ser
degustado na janta e no desayuno do dia seguinte. A minha primeira impressão em
relação aos preços aqui na Venezuela não foi nada animadora. Espero
sinceramente que nos próximos dias eu encontre lugares e alimentos mais
baratos.
Aqui na Venezuela a pretensão é
seguir para Maracaibo e depois pedalar pela costa caribenha até Coro e
posteriormente ingressar na capital Caracas, onde tentarei, definitivamente,
conseguir o visto para a Guiana Francesa. Depois o roteiro continua em direção à Ciudad
Bolívar e finalmente Santa Elena de Uairén na fronteira com o Brasil.
O período da tarde foi dedicado
exclusivamente à atualização do diário de bordo.
Dia finalizado com 39,76 km em
2h19m e velocidade média de 18 km/h.
15/01/2013 - 191° dia - Guarero a
Maracaibo
Dia de conhecer a segunda maior
cidade da Venezuela.
A noite foi tranquila em todos os
sentidos. Descansei bastante, mas ainda poderia permanecer facilmente no hotel
porque ainda havia energia a ser recuperada. No entanto, eu precisava seguir
viagem para encontrar uma hospedagem mais econômica e finalmente poder
descansar por alguns dias e realizar a atualização do site.
Hoje, para descansar o máximo
possível, não coloquei meu celular para despertar, mas ainda assim acordei cedo
e por volta das 6 horas da manhã eu já estava de pé. Sem muita pressa comecei a
arrumar minhas coisas e a preparar meu desayuno. Retornei à estrada exatamente às
7h30m.
O vento contra estava presente
mais uma vez e impediu meu avanço mais rápido, entretanto, o que mais retardou o
deslocamento foi a condição da estrada (Ruta 6) nos cinco primeiros
quilômetros. Estava repleta de buracos e muitas vezes não tinha nem mesmo
asfalto. Pedalei a 5-7 km/h neste trecho. Os outros veículos também passavam
lentamente pelo local porque não tinha alternativa.
A situação melhorou de verdade
somente após Guajira, 12 km distantes de Guarero. Para a minha felicidade a
estrada mudou de direção e o vento passou a ser lateral e a ajudar bastante. Se
por um lado os buracos terminaram, de outro a rodovia permanecia sem
acostamento e com um tráfego enorme de veículos. Como eu ainda não tinha
conhecimento do comportamento dos motoristas venezuelanos, pedalava com a maior
cautela possível.
Rodovia movimentada e sem acostamento.
A paisagem é bonita e apresenta
uma variada vegetação. Também é possível visualizar uma modesta usina eólica, pequenos lagos, muitas
palmeiras e a criação de alguns animais que deixam o ambiente ainda mais
bucólico. Uma pena que a ausência de acostamento não permita uma melhor
observação da flora e fauna da região.
Usina eólica indica que os ventos são frequentes na região.
Veículos antigos e velhos são a maioria nesta parte do país.
Lagos às margens da estrada.
In foco.
Em relação aos motoristas, me
pareceu que não terei muito problema com eles, a maioria reduziu drasticamente
a velocidade ao passar ao meu lado. A coisa chata da história é que muitos
passageiros gritavam durante a aproximação. Não sei qual a intenção, se é uma forma de
cumprimentar ou se o objetivo é mesmo assustar. Durante o caminho também voltei a
ser chamado de gringo e mister por crianças e adultos. Nem ligo
mais e respondo numa boa.
Tráfego intenso merece atenção redobrada.
Com a ajuda do vento foi fácil
manter a velocidade quase na casa dos 20 km/h e assim rapidamente cheguei à
Sinamaica, “Capital del Município Indígena Bolivariano Guajira”. Deste ponto em
diante apareceu um pequeno espaço que pôde ser utilizado como acostamento. Mas
infelizmente não estava em perfeitas condições e muitas vezes tive que retornar
à pista.
Sinamaica
Até que não falta muito para chegar à capital.
Um pedágio desativado que serve como posto policial.
Existem muitos povoados pequenos
pelo caminho e na maioria deles é possível encontrar cartazes do presidente
Chavez. As eleições aconteceram a pouco tempo e ainda existe bastante
propaganda eleitoral expostas por seus simpatizantes nas casas e veículos.
Por volta do meio dia cheguei à
cidade de Mara e aproveitei para almoçar. A sopa custava 20 bolívares e o
segundo prato 40. Deixei a entrada de lado e fiquei no aguardo da Costilla en coco. Quando a refeição
apareceu na mesa tive uma grata surpresa. Estava bastante caprichada e mais uma
vez com uma quantidade enorme de carne. Como o próprio nome sugere, ela é
preparada com coco, abundante na região, o sabor fica incrivelmente delicioso.
De tarde o sol queimava para
valer e eu sentia, mesmo com o manguito e calça, a pele pegar fogo. Faltava
aquela sombra que amenizava a temperatura no norte da Colômbia. A estrada
raramente apresentava uma árvore em suas laterais. Aliás, a rodovia não tem nem
mesmo sinalização. Não achei uma placa de trânsito pelo caminho, exceto aquela em Sinamaica que
informava a distância das próximas cidades. O que tem de sobra são as barreiras
policiais e do exército. Não fui parado em nenhuma delas, mas sempre me olharam
com uma tremenda desconfiança.
Com cem quilômetros pedalados
finalmente visualizei a cidade de Maracaibo e o lago de mesmo nome. A cidade é
enorme e tive que pedalar bastante para chegar à região central. No caminho
algumas pessoas pararam o carro ao meu lado para perguntar de onde eu era e
qual meu destino. Um casal de ciclistas
que estava em uma caminhonete me abordou e fez as mesmas questões e ainda me
ofereceu mais de dez mexericas que não foram recusadas.
Maracaibo
Ao fundo a famosa e quilométrica ponte Rafael Urdaneta.
No centro da cidade eu cheguei na
parte histórica (por volta das 16 horas) que fica próxima ao porto. Procurei
uma hospedagem econômica, mas não encontrei. Sem muita alternativa fiquei no
Hotel Caribe onde a diária custa 210 bolívares. Uma facada no coração e no
bolso também. A habitação é confortável, com banheiro e ar condicionado, mas o
que mais agradou foi o wi-fi disponível, assim tentarei atualizar o site.
Porto de Maracaibo.
Eu precisava comprar mantimentos
e procurar um caixa eletrônico para sacar dinheiro. Andei bastante, mas finalmente consegui
encontrar um supermercado. Saí do local com as mãos cheias de sacolas.
Aproveitei para encher a “despensa” e levei para o hotel; macarrão, sardinha,
molho de tomate, pão, geléia e para variar um pouco, queijo e mortadela.
Voltarei a cozinhar com maior frequência porque aqui compensa muito mais do que
ir ao restaurante. Facilmente também achei um lugar para tirar o dinheiro, mas
infelizmente a quantidade disponível era pouca e serei obrigado a realizar
outra operação, o que significa mais gastos. Paciência.
Já de noite voltei para a
hospedagem, preparei o jantar e posteriormente fui descansar o sono dos justos.
Dia finalizado com 116,88 km em
7h13m e velocidade média de 16,18 km/h.
16/01/2013 - 192° dia - Maracaibo
(Folga)
Dia dedicado exclusivamente à
atualização do diário de bordo.
17/01/2013 - 193° dia - Maracaibo
(Folga)
Dia dedicado exclusivamente à
atualização do site.
18/01/2013 - 194° dia - Maracaibo
(Folga)
Hoje eu pretendia voltar à estrada, mas não consegui finalizar a atualização do site e por isso resolvi permanecer mais um dia em Maracaibo. O período da manhã foi dedicado exclusivamente à finalização da nova postagem no diário de bordo.
Após o almoço eu vou aproveitar minha estadia na cidade para procurar alguma loja de camping para comprar um botijão de gás para o fogareiro. O meu terminou e agora, mais do que nunca, vou precisar muito dele para cozinhar e baratear meus custos na Venezuela. Também tenho que passar em um supermercado para garantir os mantimentos dos próximos dias.
Amanhã quero, sem falta, continuar a viagem em direção à Caracas onde devo chegar em uma semana. Na capital eu farei a próxima atualização do site.
No mais, quero agradecer, novamente, a todo o apoio que tenho recebido. A viagem ultrapassou todos os limites geográficos e para a minha felicidade os incentivos tem chegado até mesmo de outros países. Isso para mim é muito, mas muito importante. Por isso, meus amigos, muchas gracias.
Está acompanhando a viagem? O que tem achado? Deixe seu comentário para eu ter uma idéia da receptividade do diário de bordo.
Hasta luego!
Está acompanhando a viagem? O que tem achado? Deixe seu comentário para eu ter uma idéia da receptividade do diário de bordo.
Hasta luego!
19/01/2013 - 195° dia - Maracaibo a Vijagoita
O retorno à estrada mostrou que
existe um longo e árduo caminho até a capital venezuelana.
Antes de relatar os
acontecimentos de hoje, vou destacar algumas coisas que ocorreram durante a
minha passagem pela imensa Maracaibo. A segunda maior cidade da Venezuela me
reservou muitas surpresas, mas infelizmente não foram boas como eu gostaria. A
pior delas sem dúvida foi em relação à moeda nacional. A baixa cotação oficial
me deixou em uma situação muito, mas muito complicada.
Com o preço elevado na hospedagem
meu dinheiro trocado na fronteira não durou quase nada e por isso fui obrigado
a sacar mais plata no caixa
eletrônico. Retirei uma quantia de 600 bolívares e pensei que a conversão deixaria
meu saldo bancário 120 reais menor. Mas quando fui ver o extrato pela internet
tive uma notícia nada animadora. Foi debitado pouco mais de 300 reais da conta
corrente. A transação é realizada pela cotação oficial e por este meio 1 dólar
= 4 bolívares e 1 real = 2 bolívares. No mercado negro a moeda americana vale
10 bolívares. Resultado: ambas as moedas estrangeiras não valem nada no
comércio local.
A surpresa com a cotação foi um
verdadeiro sinal vermelho para o restante da minha viagem até Caracas. Para ter
um exemplo da situação, um almoço custa em média 50 bolívares, algo em torno de
25 reais. Desta forma o valor de uma refeição chega próximo àquele estipulado
para ser gasto (alimentação/hospedagem) durante todo o dia. Como eu não tenho
dólares para trocar com os cambistas de rua (chamado mercado negro), estou
sujeito a essa verdadeira exploração cambial.
A nova situação financeira tornou
tudo absurdamente caro. Mas eu precisava, pelo menos, fazer uma refeição diária
completa. Assim, ontem, fui a um restaurante próximo do hotel e o almoço custou
30 reais. Estava caprichado, mas ninguém merece pagar esse valor por um prato
de comida.
Para completar a história em
relação às refeições, o cartucho de gás do meu fogareiro acabou. Procurei um
novo, mas não encontrei em nenhuma loja da região central. A minha espiriteira
(Super Tuna) não funcionou e eu suspeito que seja por causa do álcool (com
fórmula diferente) que é encontrado nos supermercados. Toda vez que eu colocava
a panela sobre a espiriteira o fogo apagava. Isso tudo significava que eu teria
que fazer milagres para não ver meu dinheiro, literalmente, sumir durante os
próximos dias.
Não sei a qual ponto essa questão
com a cotação influenciou meu olhar para a cidade de Maracaibo. Mas não gostei
de quase nada que encontrei na capital do estado de Zulia. A parte histórica é
resumida a poucos prédios antigos e preservados. O trânsito é extremamente
movimentado e a limpeza das ruas e calçadas não é nada convidativa a um
passeio. Situação que se agrava quando a temperatura facilmente passa dos
35°C. Claro que isso não se aplica à região onde se encontram os principais
prédios governamentais. Nesta área uma praça bastante arborizada ameniza o
forte calor. Esse ambiente agradável e limpo foi um dos poucos que encontrei no
município.
Uma parte do pequeno centro histórico de Maracaibo.
O antigo e velho contrasta com o histórico. Parte mais bem preservada do casco histórico. Não me refiro ao veículo, claro.
In foco.
O comércio do centro também não
oferece nada de muito atrativo, ainda mais quando sua moeda é tratada como uma
piada, diga-se de passagem, de mau gosto. Nos supermercados a organização dos
produtos nas gôndolas está distante daquela que encontramos no Brasil. É uma
verdadeira batalha para encontrar o preço referente a cada produto. Pior ainda
foi não achar aquilo que eu precisava: uma simples pasta de dente. Uma mulher
me disse que seria muito difícil encontra-la na cidade. Misericórdia!
Aproveitei a minha passagem pelo
supermercado apenas para comprar pão, geléia e suco para a sequencia da viagem.
Depois caminhei pelas ruas para encontrar a pasta de dente, que infelizmente
não foi achada. O que apareceu foi a igreja mais conhecida da cidade: Catedral
(Basílica) de la Virgen de la Chiquinquirá, padroeira do estado Zulia. Um
evento que estava prestes a acontecer no pátio da igreja deixou a área bastante
movimentada.
Catedral de la Virgen de la Chiquinquirá
Catedral de la Virgen de la Chiquinquirá
Sem interesse para saber o motivo
de toda aquela concentração na frente da catedral eu continuei a caminhada,
desta vez em direção ao hotel, não sem antes passar pela magnifica praça central
que tem uma enorme estátua da Virgen de la Chiquinquirá. O belíssimo jardim
também se destaca e deixa a cidade com uma impressão um pouco melhor.
Plaza Central
Uma das igrejas ao redor da Plaza Central.
Na volta ao hotel deixei parte da
minha bagagem arrumada e aproveitei a internet disponível para conversar com
familiares e amigos. É incrível como nestes momentos as horas passam em questão
de segundos. Quando percebi já havia passado da hora de descansar. Fui dormir
quase a meia noite.
Hotel Caribe. A hospedagem mais "barata" que encontrei em Maracaibo.
Hoje eu não madruguei. Estava
cansado pela andança nas ruas de Maracaibo e por isso achei melhor não colocar
o celular para despertar. Acordei naturalmente e levantei mais tarde do que
realmente gostaria. Resultado foi que a minha saída do hotel ocorreu apenas às 8
horas da manhã. Ainda na frente da hospedagem perguntei a um senhor a direção
para a ponte Rafael Urdaneta. Com as devidas informações comecei a pedalar
sentido à ponte sobre o Lago Maracaibo.
O dia estava bonito e o clima
ainda era agradável nas primeiras horas da manhã. Sem dificuldade logo
encontrei a rodovia que seguia para a ponte que eu precisava atravessar. Eu
estava um pouco apreensivo porque não tinha certeza se conseguiria passar pelo
local com a bicicleta. Haviam me alertado que a brisa muito forte impede que ciclistas transitem sobre a imensa
obra. De qualquer forma continuei o pedal junto ao trânsito intenso que marca a
saída de Maracaibo.
Com dez quilômetros pedalados
apareceu a cidade de San Francisco e logo na sequencia eu já avistava a Ponte
Rafael Urdaneta. Com extensão de oito quilômetros era mesmo difícil de
acreditar que a polícia permitisse minha passagem. Aproximei-me da entrada da
ponte e verifiquei a barreira dos homens fardados que realizavam uma
fiscalização aleatória nos veículos. Avancei um pouco e fui obrigado a parar ao
sinal do policial.
Chegada à San Francisco.
Ponte Rafael Urdaneta
Primeira imagem da enorme ponte sobre o Lago Maracaibo.
Ponte Rafael Urdaneta
O policial me informou que eu não
poderia seguir pedalando sobre a ponte porque somente veículos motorizados
estavam liberados. A justificativa? O vento forte poderia me arremessar para o
lago. Acontece que naquele exato momento a brisa era quase imperceptível e eu
não teria problemas nenhum para atravessar. Mas como eu não queria criar
confusão nem argumentei nada. Apenas perguntei como seria possível avançar e me
responderam que era necessário aguardar por algum veículo que pudesse realizar
meu deslocamento.
Acho que precisei esperar em
torno de 10-15 minutos até conseguir um caminhão-guincho. Neste período
apareceram muitas caminhonetes com espaço suficiente para transportar a
Victoria, mas infelizmente os policiais não autorizaram a minha passagem com
esses veículos. O motorista do guincho não se opôs ao pedido oficial de
conceder a travessia para mim e a Victoria.
Precisei de ajuda para colocar a
minha companheira fiel sobre o caminhão. Afinal eu não conseguiria levanta-la
com toda aquela carga. Sobre o veículo a Victoria foi devidamente amarrada e eu
consegui um lugar na cabine. A distância de oito quilômetros passou rapidamente
e no final da ponte eu desembarquei junto com a bicicleta. Agradeci ao
motorista e voltei a pedalar, não sem antes registrar a cidade de Maracaibo na
outra margem do imenso lago.
A cidade de Maracaibo na outra margem do lago homônimo.
Meu objetivo era seguir em
direção à Coro que ficava a quase 250 km de Maracaibo. Pretendia cobrir essa
distância em dois dias se nenhum imprevisto estivesse pelo caminho, claro. Na
estrada, logo após a ponte, encontrei com alguns ciclistas em final de
treinamento. Convidaram-me para tomar alguma coisa no posto de combustível que
havia à beira da rodovia, mas não pude aceitar porque eu precisava avançar e a
temperatura começava a ficar elevada.
Os ciclistas me recomendaram
seguir para Caracas através de Barquisimeto e não via Coro, como eu estava
prestes a fazer. Segundo eles, a primeira opção era mais montanhosa, contudo,
com um clima muito mais ameno, rodovia duplicada e com auxilio e casas pelo
caminho. Eu até pensei em continuar por Barquisimeto, mas a idéia de pedalar
pelas subidas não me agradava. Eu queria mesmo era avançar pelo relevo plano,
ainda que para isso eu tivesse que enfrentar as elevadas temperaturas da
região. Agradeci pelas informações e continuei.
Não demorou e logo apareceu o
trevo para Coro e/ou Barquisimeto. Hesitei um pouco, mas decidi continuar a
jornada pelo litoral. Uma placa indicava que daquele ponto a cidade de Coro
estava a 234 km. Minha parada no final do dia ficou de ser realizada na cidade
de Debajuro.
Primeiros quilômetros pela Ruta 3 em direção à Coro.
A estrada não estava movimentada
como também havia advertido os ciclistas, contudo, realmente era de pista simples
e sem acostamento. A temperatura certamente não era das mais recomendadas para
pedalar, estava muito quente. As árvores à beira da rodovia nos quilômetros
iniciais logo desapareceram e uma vegetação rasteira e seca passou a ser
predominante. O mesmo não ocorreu com as pequenas comunidades que eram cada vez
mais raras de serem avistadas pelo caminho.
Falta de acostamento
Vegetação seca.
Na parte da manhã eu havia
realizado meu desayuno com pão, geléia e leite, contudo, pedalava sem as
energéticas bolachas recheadas. As galletas
estavam muito caras em Maracaibo e por isso iniciei o pedal sem elas. Acontece
que por volta do meio dia a fome bateu e eu precisava comer algo reforçado para
seguir viagem. Desta maneira parei em um restaurante com 66 km pedalados e o
almoço custou algo em torno de 25 reais. A costilla
en coco estava uma delícia e o prato bastante caprichado.
Não havia muita gente no
restaurante, mas aqueles que estavam presentes ficaram bem curiosos com a
viagem. As perguntas logo começaram e parecia não ter fim. Mas eu não tinha
problema em respondê-las. Minha dificuldade era entender o que o pessoal
falava. Isso porque o espanhol nesta região é estranho e rápido demais, muitas
vezes nem parece que é o mesmo idioma que eu tento aprender a quase seis meses.
Tive que me esforçar para compreender e não deixar ninguém sem resposta.
Com a refeição a um preço
extremamente elevado, uma coisa era certa, eu deveria acampar em algum lugar no
final do dia. Porque eu necessitava decidir entre a alimentação e a hospedagem
e claro que não pensei em escolher a primeira opção. Também não poderia me dar
ao luxo de jantar, pelo menos uma refeição completa. Na bagagem eu carregava
pão, sardinha, molho de tomate, macarrão e queijo ralado que poderiam ser
consumidos para saciar um pouco a fome que certamente eu sentiria de noite.
Logo após o restaurante eu passei
a pedalar no Estado de Falcón. Na divisa de estados havia um posto policial
onde fui parado somente para responder as perguntas de praxe. Fiquei surpreso
quando um dos policiais perguntou se poderia tirar uma foto minha com seu
celular. Foi realmente algo inesperado, mas eu não me importei em ser
registrado.
Divisa entre os estados de Zulia e Falcón.
Se por um lado não mudou muita
coisa em relação à paisagem no território de Falcón, o mesmo não se pode dizer a
respeito da temperatura. O termômetro sem dúvida deveria estar na casa dos
35-40°C. Para não gastar com protetor solar eu continuava a pedalar todo
“empacotado” de roupa. Mas acabei por me acostumar com a calça e o manguito,
mesmo com esse clima quente. Essas vestimentas não tem sido um problema na
viagem.
Com o avanço do pedal eu tive a
felicidade de começar a encontrar várias casas às margens da rodovia. Às vezes
se tratava de apenas pequenas comunidades ou modestas propriedades rurais. De
qualquer forma isso me animava porque era sinal que eu poderia parar em uma
delas no final da tarde para montar acampamento com a permissão do
proprietário, claro.
O vento contra apareceu com mais
intensidade por volta das 16 horas e retardou bastante meu deslocamento e o
cansaço não demorou a aparecer. Uma hora mais tarde, enquanto eu pedalava mais
atento para encontrar um lugar seguro para montar acampamento, percebo que meu
pneu traseiro estava furado. Misericórdia. Parei na frente de uma chácara e
comecei a realizar a troca da câmera de ar furada. Na finca (propriedade rural) ninguém me atendeu e tive que descartar
qualquer possibilidade de permanecer no local. Assim fui obrigado a avançar
logo após o conserto no pneu.
Essa nunca é uma tarefa fácil.
O crepúsculo indicava que a noite
estava prestes a chegar e eu não estava disposto a pedalar neste período. Por
isso comecei a agilizar um lugar para passar a noite. Parei em uma casa, mas
minha permanência não foi autorizada com a alegação de que o local tinha muita
gente. A justificativa era válida porque realmente várias crianças se
encontravam no quintal. Paciência!
Também não tive sucesso na
segunda tentativa. Desta vez o senhor que me atendeu disse que não era o proprietário
e por isso não poderia me ceder um espaço no terreno. Apesar das respostas
negativas eu não poderia desistir e continuei mais um pouco na estrada até
encontrar outra casa onde eu esperava ter mais sorte.
Na casa, à beira da estrada, onde
eu parei (às 18h15m) fui atendido pelo Rafael a quem eu expliquei a viagem e mencionei
que precisava apenas de um espaço seguro para montar minha barraca, passar a
noite e seguir logo na manhã seguinte. É importante sempre deixar bem claro o
que você realmente necessita para que a pessoa não tenha dúvidas de sua
intenção. O Rafael compreendeu minha situação e autorizou minha estadia na área
de sua residência. Era o que eu precisava.
Montava o acampamento e ao mesmo
tempo conversava com o Rafael que também não deixou de fazer as perguntas que
já estou acostumado a responder. Em pouco tempo a minha casa estava levantada e
eu pronto para descansar. O banho ficaria atrasado, mas eu não me importei com
isso, embora eu estivesse sujo e suado. Eu queria mesmo era preparar o meu
jantar.
Sem cartucho de gás para cozinhar
a opção foi improvisar. Fiz uma mistureba
com sardinha, molho de tomate, queijo ralado e um tempero especial que a mãe
preparou e que poucas vezes usei na viagem. Isso tudo passou a ser o recheio do
pão que eu ainda tinha na bagagem. Ficou uma delícia e acho que enganou a fome.
Fiz algumas anotações em meu
caderno e logo depois fui tentar dormir. O local me parecia bastante seguro e
não me preocupei com isso. Mas eu tinha plena consciência que a noite não seria
das mais silenciosas porque a estrada estava bem ao lado da propriedade e
consequentemente da minha barraca. Mas o importante mesmo era tentar descansar
as pernas para o dia seguinte.
Dia finalizado com 115,80 km em
7h17m e velocidade média de 15,88 km/h.
20/01/2013 - 196° dia - Vijagoita
a Barrialito
E a viagem continua
surpreendente.
Hoje foi um grande exemplo de
como a expedição ainda reserva muitas coisas inesperadas.
A noite no acampamento foi mais
tranquila do que eu imaginava. Durante a madrugada o movimento na estrada deve
ter diminuído bastante e o barulho dos veículos pouco incomodou meu sono. Se
não foi isso provavelmente é a adaptação do meu corpo a esse tipo de situação.
Levantei por volta das seis horas
da manhã e na sequencia comecei a desmontar a barraca e a colocar tudo em seus
devidos lugares. O Rafael apareceu e me trouxe um pedaço de pão doce (típico da
região) e uma xicara de café. Eu tampouco sou apreciador desta bebida, mas não
poderia negar a gentileza do anfitrião. E de certa forma o café foi bem-vindo
para completar o desayuno.
O Rafael saiu para trabalhar e
poucos minutos depois eu também deixava a casa para começar mais um dia de
viagem. Às 07h10m eu voltava à estrada. O tempo demonstrava novamente que em
poucas horas o sol voltaria a castigar. O pessoal com quem conversei durante o
caminho me disse que não chove a mais de um mês na região. Algo que fica muito
evidente na vegetação.
Residência do Rafael. Acampamento debaixo da área coberta.
Os primeiros quilômetros foram
tranquilos, mas as dificuldades não demoraram a aparecer. O vento contra
começou tímido e gradualmente ganhou força e diminuiu bastante meu ritmo. Com
19 km eu cheguei à cidade de Dabajuro onde eu havia planejado terminar o pedal
de ontem. No perímetro urbano eu parei em uma borracharia (aqui chamada de
Caucharia) e fui completar a calibragem do pneu traseiro para poder seguir com
mais facilidade.
Mais uma vez o recado foi passado.
Perimetro urbano de Dabajuro.
O trajeto continuou plano na
maior parte do tempo, contudo, as “subidas” foram mais frequentes do que o
trecho de ontem. De qualquer forma, o que dificultava o avanço era o vento cada
vez mais forte. Essa vida de ciclista não é fácil. Quando não tem subida é o
vento contra, quando este não atrapalha é a vez do sol ser responsável por
deixar a situação complicada com a temperatura elevada. E não raramente se soma
tudo isso e está completo o desafio da mãe natureza. Aceita-lo ou não fica à
sua escolha.
O sobe e desce do trajeto.
A estrada após Dabajuro
apresentou um pequeno “acostamento”, mas muitas vezes era impossível pedalar
por este espaço em razão das tulas, a
vegetação espinhosa que se encontra às margens da rodovia. Somente as cabras,
que são maioria na região, conseguem se locomover com facilidade entre essas
árvores.
As tulas invandem todo o acostamento.
Pequenos vilarejos também são
encontrados com facilidade durante o caminho. Ainda era cedo, mas eu já havia
decidido que na hora do almoço eu deveria parar em uma destas casas. A
pretensão era conseguir alguém disposto a ceder a cozinha de sua residência
para eu poder preparar meu macarrão. O amigo e cicloturista Phillip Borja
comentou uma vez comigo que sempre levava um pacote de macarrão na bagagem e em
caso de emergência pedia para alguém cozinhar a massa. Eu me lembrei disto e
achei que poderia dar certo. Seria uma economia tremenda diante da minha
situação financeira.
Pequenos vilarejos pelo caminho.
Quando chegou a hora do almoço eu
comecei a pesquisar um lugar simpático onde provavelmente poderiam me ajudar
com a refeição. Eu sou tímido demais e confesso que esta era uma ocasião
atípica e difícil para mim. Nunca havia realizado este tipo de abordagem e por
quilômetros fiquei a ensaiar as palavras que deveria dizer. Ainda procurava a
frase correta quando passei por uma casa e resolvi parar e colocar a estratégia
em prática.
Quem me atendeu na casa foi o
senhor Antônio a quem comecei a explicar que era brasileiro e viajava
de bicicleta pelos países da América do Sul e que naquele momento eu precisava
preparar meu almoço. Mencionei que carregava a cozinha e a comida no bagageiro,
mas que meu gás havia terminado e eu não conseguira fazer a reposição em
Maracaibo. Para finalizar disse que precisava apenas ferver a água para cozinhar a pasta (forma como eles costumam
se referir à massa) e consequentemente preparar meu macarrão.
O senhor Antônio, como quem não
esperava este tipo de pedido, ficou a pensar um pouco e logo disse que não
tinha problema e abriu o portão da residência. Que maravilha! Eu estava muito,
mas muito feliz mesmo por ter conseguido na primeira tentativa. Isso
significava que eu estaria com a barriga cheia em poucos instantes.
Peguei minha panela e com a
permissão do proprietário entrei na simples cozinha para colocar a água para
ferver. Senhor Antônio preparava a famosa arepa para a sua refeição. Começamos
uma conversa bem interessante que fez o tempo passar rapidamente. Em poucos
minutos a massa do macarrão estava cozida e pronta para ser degustada com
sardinha, molho de tomate e queijo ralado. Combinação perfeita, sobretudo, para
quem está morto de fome.
Senhor Antônio me contou que sua
mulher havia falecido há alguns anos e que atualmente vivia com um dos seus
filhos. O rapaz logo chegou para almoçar e meio desconfiado com a minha
presença disse poucas palavras. Eu tinha preparado macarrão para duas
refeições, mas a panela ficou limpa em questão de minutos. Fome!
Assim que acabei de almoçar,
visitas chegaram na casa e fui apresentado a elas. Como já disse uma vez, estes
momentos são perfeitos para eu aperfeiçoar o idioma. Compreendo espanhol muito melhor do
que falo, isso é verdade, mas consigo manter um diálogo razoável
com qualquer pessoa.
Expliquei detalhadamente a
expedição para todo mundo na casa. Muitos continuam a perguntar, mesmo no
exterior, se estou a pagar promessa ou porque eu não viajo de carro ou moto.
Então respondo que a viagem é uma forma de conhecer os lugares, culturas,
histórias e as pessoas de cada país sul-americano. E que a bicicleta permite
uma aproximação maior com essas questões. Quando eles passam a entender o
motivo da expedição ficam atônitos em ver com os próprios olhos o que é
possível realizar com um meio de transporte aparentemente limitado e simples.
Ganhei um pedaço enorme de
melancia ou patilla como eles falam
na Venezuela. Com aquele calor foi uma ótima sobremesa, perfeita para a
hidratação. Na sequencia fui lavar minhas coisas e completar as garrafas de água.
Antes de voltar à estrada tirei uma foto com todo mundo reunido e agradeci
imensamente por toda a gentileza.
Na casa do senhor Antônio (sem camisa). Família e amigos.
No período da tarde a temperatura
estava ainda mais alta e a sensação térmica apenas não era maior porque ventava
cada vez mais. Em um determinado trecho um veículo parou ao lado da estrada e o
motorista abriu a porta e começou a tirar fotos de mim. Quando me aproximei a
família toda no interior do automóvel fazia o mesmo. Até pareceu que eu era
famoso. A diferença é que eu estava em liberdade, algo que não acontecia com os
“paparazzi” de plantão. A família era de Valência e ficou curiosa por saber
mais detalhes da viagem.
O animal que mais se encontra
pela região é sem dúvida a cabra. Muitas casas às margens da estrada oferecem
carne, queijo, leite e também a pele do animal. Quando me deparei com uma
barraca que vendia este último item fui obrigado a parar e fazer um registro
fotográfico com a autorização do homem que estava no local. Segundo ele, a pele
é utilizada para muitas coisas, inclusive na fabricação de cadeiras. O preço de
cada peça (?) é o equivalente a cinco reais. Já um filhote de poucos dias
custava aproximadamente 50 reais.
Pele de cabra à venda na beira da estrada.
Imagem que resume boa parte da vegetação local.
O avanço vespertino foi menor do
que eu imaginava e infelizmente não seria possível chegar à Coro no final do
dia, como era pretendido. Paciência! Com a chegada da noite eu tive que
procurar um lugar para montar acampamento. Novamente as duas primeiras
tentativas foram sem sucesso. Na primeira propriedade o dono justificou que o
cachorro poderia me estranhar e morder. Achei que foi pura desculpa, mas tudo
bem. Já na segunda casa, o senhor que me atendeu mencionou que não era o dono e
consequentemente não tinha autorização para permitir a minha presença no local.
Continuei em frente.
Propagandas deste tipo é bastante comum pela região.
Na terceira tentativa parei em um
lugar que pouco provavelmente eu pararia em outra ocasião. Era uma pequena
comunidade, mas onde muita gente estava reunida na frente de suas residências.
Novamente tive que deixar a timidez de lado e fui conversar com o pessoal para
ver se alguém poderia me conceder um espaço em seu terreno. Expliquei a
situação e ficaram um pouco sem saber o que fazer, até que uma mulher (Dona
Doris) pediu que eu a acompanhasse.
Fui encaminhado para ser
apresentado ao proprietário de uma casa onde possivelmente eu poderia levantar
acampamento. O rapaz era filho da Dona Doris, senhora que se dispôs a me levar para
conversar com ele. Ao saber da viagem e o que eu precisava ele não hesitou em
permitir minha presença no local. O terreno era grande e compreendia a casa da
mãe e filho, lado a lado. Pensaram no melhor lugar para montar a barraca, mas
no fim cogitaram a idéia de eu dormir na rede. Achei que poderia ser uma
experiência interessante e aceitei a sugestão.
Com a idéia de dormir na rede eu
ganharia tempo na manhã seguinte já que não precisava desmontar o acampamento. Mas
acontece que eu não estou nada acostumado a dormir neste tipo de leito. Seria
uma oportunidade para adaptar meu corpo a mais um tipo de situação.
Antes de fazer qualquer coisa
conversei bastante com a família que aceitou me receber. Descobri que o filho
da Dona Doris também se chamava Nelson. Não à toa é gente boa. Mais um xará que
encontro na viagem. A conversa girou em torno das mais variadas temáticas.
Quando começamos a falar sobre política eu passei a ter conhecimento um pouco
melhor das medidas adotadas pelo governo socialista do presidente Chávez.
É preciso muita cautela para
analisar o governo chavista. Acho que a situação na Venezuela é muito mais
complexa do que parece. Sem dúvida o país é internacionalmente conhecido em
razão do socialismo empregado pelo mandatário Hugo Chávez desde o final do
século XX. Mas a mídia adora frisar somente as coisas negativas que acontecem
aqui. Por isso eu tinha consciência que estar na Venezuela seria uma
oportunidade de viver a realidade do país e refletir sobre sua atual situação.
Pois bem, confesso que quando
atravessei a fronteira para a Venezuela, todo aquele cenário de carros antigos
e velhos me fez associar o país à Cuba. Mas em Maracaibo a situação mudou
completamente e o socialismo na prática ficou restrito a faixas e cartazes. A
cidade não se difere muito de qualquer outra considerada capitalista. O
comércio é bastante movimentado e grandes marcas internacionais são facilmente
encontradas por estas bandas. Coca-Cola e Mcdonalds estão presentes sem maiores
restrições.
Outro fato curioso está
relacionado ao petróleo. A gasolina no país é a mais barata da América do Sul e
talvez do mundo e isso sem dúvida é um fator decisivo para que as pessoas
tenham um veículo. E aqui eles são inúmeros. Se na região fronteiriça as
antiguidades eram maioria, o mesmo não se pode dizer de Maracaibo e das cidades
subsequentes. São diversas marcas e modelos novos que circulam pelas ruas,
avenidas e estradas. E isso me parece um pouco contraditório na medida em que o
veículo motorizado é a invenção mais bem sucedida do capitalismo uma vez que
todo um mercado gira ao seu redor. Aqui a única exceção é o combustível, no
mais, a cadeia comercial continua a mesma. Então não sei até que ponto essa
baixa no preço do petróleo é realmente válida para um governo considerado
socialista.
Na casa do Nelson e da Margarita
(sua esposa) eu descobri algumas politicas adotadas pelo Chávez e que talvez
pouca gente fora daqui tenha conhecimento. Soube, por exemplo, que todas as
crianças ao ingressarem na escola ganham um computador portátil para terem
conhecimento e contato com o mundo da informática. Tive a oportunidade de ver o
computador do filho do casal e achei sensacional.
Outra medida do governo que eu
também não tinha conhecimento diz respeito às moradias. Milhares de casas foram
construídas e entregues sem nenhum custo para as famílias que ainda não tinham
a sonhada casa própria. Para, além disto, soube que o governo realiza reformas
em residências que necessitam de reparos. A casa da mãe do Nelson é um exemplo,
recentemente passou a ter janelas e telhado novos. Claro que existe todo um sistema
de cadastramento para saber quem realmente precisa destes benefícios. A medida
certamente ajuda a parcela menos favorecida economicamente.
As novidades a respeito do
governo chavista continuaram. Aqui a aposentadoria passou a ser automática a
todo cidadão que completar 60 anos de idade. E para receber o beneficio não é
preciso ter contribuído para o estado durante os anos trabalhados. Que tal?
Acho que todo
governante deveria realizar essas medidas em prol de qualquer cidadão. Acontece que pouco
disto se faz na prática em um governo capitalista. Neste ponto é preciso
enaltecer o governo Chávez que admite que o país está em um processo de
transição. Realmente uma revolução não se faz de um dia para outro.
Conforme mencionado, é preciso
cuidado para analisar a situação de todos os ângulos. Espero sinceramente que
este sistema politico e econômico adotado pelo governo não seja apenas uma
forma mascarada para angariar votos, sobretudo, da população mais carente, que
no caso é a que mais tem sido beneficiada com as medidas adotadas pelo Chávez.
Após muita conversa com a família
do Nelson, fui convidado à mesa para degustar a comida da mãe do anfitrião. Uma
deliciosa macarronada acompanhada de salada e a famosa arepa que está presente
na refeição de vários venezuelanos. Fiquei realmente muito feliz pela
hospitalidade. Fui recebido como um grande amigo.
Devidamente alimentado fui tomar
um banho minutos depois. Eu não ousaria pedir para utilizar o banheiro, mas
perguntaram se eu não gostaria de uma ducha e então não pensei duas vezes para
aceitar a sugestão. A casa não conta com água encanada, portanto, a limpeza
aconteceu com auxilio de um balde que foi mais do que suficiente para eu ficar
limpo de novo.
Eu estava com a cabeça repleta de
pensamentos, a barriga cheia, corpo limpo e alma em paz. O que mais um viajante
pode querer durante sua expedição? Sem dúvida todo esse ambiente transformou o
dia em um dos mais emocionantes da viagem.
Se durante o dia a temperatura
estava nas alturas, a mesma despencou no período da noite. Antes de dormir na
rede recebi cobertores porque a madrugada prometia ser fria. Ventava bastante e
a sensação térmica não seria das mais agradáveis sem as peças concedidas. Fui
deitar por volta das 22 horas.
Dia finalizado com 103,59 km em
8h03m e velocidade média de 12,85 km/h.
21/01/2013 - 197° dia -
Barrialito a La Isla
Encontro com o Mar do Caribe
venezuelano.
Que experiência! Acho que foi a
primeira vez que passei a noite inteira em uma rede. E surpreendentemente
superou qualquer expectativa. Durante a madrugada eu me mexi um pouco até
encontrar uma posição mais confortável para descansar. O frio esteve presente,
mas os cobertores foram suficientes para que isso não se tornasse um problema
ao meu sono. Tudo aprovado!
Acordei e levantei por volta das
6 horas e como não havia tirado muitas coisas dos alforjes, em poucos minutos
eu já estava pronto para partir, não sem antes ser convidado para desayunar na
casa da Dona Doris. Ela fez questão de me preparar arepa recheada com ovo
mexido e carne. Também me trouxe uma xicara de café e um copo de suco. Não
recusei nada e degustei tudo o que havia à disposição. Excelente forma de
começar o dia.
Em poucos minutos o pessoal
começou a aparecer na casa e antes da minha partida, registramos o momento e
nos despedimos. Na bagagem, além de todo o aprendizado, mais dois livros de
história que ganhei da mãe do Nelson. É um peso a mais que vale a pena de ser carregado.
Analisarei com mais tranquilidade assim que terminar a viagem. Obrigado por
tudo, família.
Uma das famílias mais hospitaleiras de toda a viagem. Obrigado Margarita, Nelson e Dona Doris.
Hasta luego, camaradas.
O objetivo do dia era avançar o
máximo possível sem desconsiderar a condição climática e o relevo do trajeto.
As duas primeiras horas de pedal foram tranquilas, mas depois o vento apareceu
e a sensação era de que a bicicleta estava presa ao chão. A estrada se
transformou em uma pequena montanha-russa e o avanço foi muito aquém do
esperado.
Flagrantes..
In foco.
Com 41 km pedalados finalmente
cheguei à Coro, a única cidade venezuelana decretada como Patrimônio Cultural
da Humanidade em razão do centro histórico mais bem preservado do país,
conforme menciona o Guia Viajante Independente que também lembra que a cidade
foi a primeira fundada na Venezuela e também a primeira capital.
Finalmente na única cidade declarada Patrimônio Cultural da Humanidade.
Todavia a região periférica de
Coro, infelizmente, nos mostra uma realidade bastante triste. Casas
extremamente simples em meio a muito lixo é o que podemos visualizar à beira da
estrada. Aliás, essa questão do lixo vem sendo uma constante desde o norte da
Colômbia. Uma situação muito parecida com aquela que encontrei na Bolívia. Um
ponto negativo para as autoridades e aos próprios cidadãos pela falta de consciência
e respeito ao meio ambiente.
Apesar de litorânea, não é
possível ver o mar no perímetro urbano de Coro que, por sua vez, teve uma
extensão de mais de dez quilômetros. Trecho bastante movimentado e trânsito
intenso com todo o tipo de veículo. Precisei ter mais atenção com as placas na
estrada para seguir em direção à Valência. Muitas vezes tive que recorrer à
população para não pegar o caminho errado.
Aqui o sistema é bruto. Quase não acreditei quando enxerguei tal ousadia.
O que tem me surpreendido
bastante aqui na Venezuela é o número de pessoas que me abordam no meio da rua,
avenida e rodovia. Em Coro até um motorista de ônibus diminuiu a velocidade e
bloqueou a estrada somente para saber mais sobre a viagem. Minutos antes um
motociclista teve a mesma atitude. Às vezes eu respondo rapidamente para não
atrapalhar o trânsito, mas quanto mais eu explico sobre a expedição maior é a
curiosidade e os questionamentos. Acho isso incrível!
No final do perímetro urbano de
Coro eu encontrei um restaurante bem simples ao lado da estrada e resolvi
perguntar o preço da refeição. A mesma
custava 40 bolívares, algo em torno de 20 reais. Nada barato, mas eu precisava
comer alguma coisa além de macarrão e por isso achei que deveria investir no
almoço. A comida estava caprichada e a novidade foi o arroz preto que apareceu
pela primeira vez durante a viagem.
Uma das entradas/saídas de Coro.
Registro garantido da Victoria na capital do estado de Falcón.
Você dificilmente verá um destes no Brasil, infelizmente.
Duas placas um tanto equivocadas.
Refeição típica da Venezuela. Destaque para o feijão preto.
Não parei em Coro por um simples
motivo. Em poucos dias terei a oportunidade de voltar à cidade com mais calma,
tempo e dinheiro. Acontece que desde o inicio do planejamento eu havia
reservado um período para conhecer as praias caribenhas da Venezuela.
Inicialmente passaria sozinho pelos lugares paradisíacos, contudo, no decorrer
da viagem uma amiga brasileira de longa data me avisou que estaria na região em
fevereiro. Combinamos de nos encontrar em Caracas e posteriormente começar uma
visita aos lugares imperdíveis de conhecer aqui no Caribe.
A minha chegada à capital
venezuelana marcará o início de um período de descanso para mim e a Victoria,
que a principio ficará na casa de um membro do warmshowers em Caracas, enquanto eu realizo
o passeio pela região litorânea do país. Meu problema financeiro deve ser amenizado
com a chegada desta minha amiga, uma vez que depositei dinheiro para ela
comprar e me trazer o valorizado dólar. Com a moeda americana em mãos eu poderei
troca-la no mercado negro e enfim ter uma estadia normal na Venezuela.
Desde o começo da expedição eu
tenho muito claro que o objetivo da viagem não consiste apenas em pedalar,
pedalar e pedalar. Para mim é essencial conhecer tudo aquilo que está ao meu
alcance. Com este pensamento colocado em prática eu tive a felicidade de
conhecer inúmeros lugares, culturas, sabores, histórias e pessoas
interessantes. Por isso acho que não posso perder a oportunidade de aproveitar
essas praias que parecem ser fantásticas. Chegou a hora de finalmente dar um
mergulho no mar e quem sabe pegar umas ondas.
No restaurante em Coro reabasteci
minhas garrafas de água e voltei a pedalar. O período da tarde a situação ficou
ainda mais complicada com o vento contra e as inclinações na estrada. Mas
também houve boas surpresas. Precisei pedalar 73 quilômetros desde a minha
saída de Barrialitos para finalmente avistar o Mar do Caribe em território
venezuelano. Foi sem dúvida emocionante ver toda aquela imensidão azul. Fiquei pensando, mais uma vez, sobre a localização geográfica aonde a Victoria e eu
chegamos.
Na histórica La Vela.
Um parque paleontológico que apareceu no trajeto.
In foco.
O caribe venezuelano pela primeira vez diante dos meus olhos.
Pedalar com essa paisagem é sem dúvida animador.
Mar do Caribe
Infelizmente o pedal ao lado do
mar foi mais curto do que eu gostaria, mas ainda assim serviu para animar e
vencer as barreiras naturais e as subidas que ficavam cada vez mais extensas
entre um povoado e outro. Na região facilmente se encontram barracas às margens
da rodovia que vendem: coco; água de coco; doces; e a tal arepa pelada, cujo nome me deixou curioso para saber sua
particularidade.
Subidas cada vez mais extensas.
Em uma das comunidades eu parei
no ponto de ônibus para descansar por alguns minutos. A fome não era imensa,
mas eu sentia falta de açúcar no sangue. Como não tinha mais as bolachas recheadas
e nenhum doce para comer, a solução foi recorrer à laranja que ganhei da Dona Doris,
mãe do meu xará. Sem dúvida ajudou a amenizar a situação.
Além do Mar do Caribe o que também
passou a chamar atenção foi a quantidade de carros queimados e abandonados à
beira da estrada. Já havia me deparado com uma situação parecida nos dias
anteriores e pensei que era fruto de acidentes e que o incêndio não passava da
consequência do estado critico em que se encontram muitos veículos. Mas a frequência
com a qual eu passei a avistar esses automóveis era assustadora.
Logo depois da minha pausa no
ponto de ônibus eu comecei a procurar uma casa para novamente solicitar a minha
permanência para passar a noite. Na primeira tentativa o proprietário foi pedir
opinião de outros familiares e quando retornou respondeu que não seria possível
por causa do cachorro que poderia me morder. Mais uma vez colocaram a culpa no
animal. Continuei à procura, afinal, a noite chegaria em poucos instantes.
Eu quase passei despercebido por
uma pequena propriedade rural, mas quando notei a presença de pessoas na frente
da casa não pensei duas vezes para tentar um espaço no terreno. Com a licença
concedida me aproximei do pessoal e fiz a explicação básica de quem eu era e o
que necessitava. A família pensou um pouco e rapidamente deu sinal positivo
para eu montar a barraca ao lado da casa. Maravilha!
Assim que montei a barraca e
troquei de roupa fui conversar com os proprietários e alguns amigos que estavam
no local. Entre outras coisas eu confirmei todas as informações passadas pelo
Nelson e a Margarita a respeito das medidas politicas do governo Chávez. Também
descobri que muitos dos veículos queimados encontrados na rodovia eram
resultados de furtos. A prática era realizada pelos ladrões para não deixarem
pistas após levarem as peças que lhes interessava. Sinistro!
A família me tratou muitíssimo
bem e enquanto conversávamos me serviram um prato com arepa pelada (mais parece uma torta) e dois pedaços de carne frita.
A arepa diferente não é menos saborosa que as outras, contudo, me pareceu mais
forte no sentido que tem sustância. Algo que meu organismo agradeceu
imensamente.
O pessoal que abriu as portas de
sua casa para a minha estadia também perguntou se eu não queria tomar um banho.
Aceitei a sugestão e novamente fui me limpar com o balde em uma área reservada
no lado de fora da casa. O banho foi rápido e na sequencia voltei à roda de
conversas e posteriormente fui dormir para descansar e recuperar as energias
para o dia seguinte.
Dia finalizado com 113,10 km em
8h19m e velocidade média de 13,59 km/h.
22/01/2013 - 198° dia - La Isla a
Sanare
Comecei o dia às 3 horas da
madrugada e terminei na polícia.
A noite no acampamento tinha tudo
para ser tranquila. O lugar era seguro e até um pouco distante da estrada. Mas
o improvável aconteceu. Pouco depois das 3 horas da manhã acordei com barulho
de chuva na barraca. O clima mudou radicalmente durante a noite e realmente me
surpreendeu. Isso porque na hora de dormir ainda lembrei de verificar o céu e
estava todo estrelado e em nenhum momento eu imaginei que poderia chover de
madrugada.
Minha barraca é simples e não
aguenta muita água. Como eu estava em uma área descoberta, tratei de desmontar
acampamento rapidamente e transferir todas as coisas para um pequeno espaço
coberto na frente da residência. Foi uma ótima decisão porque a chuva ficou
cada vez mais forte. Eu bem que gostaria de continuar meu sono, mas aproveitei
a situação para começar a guardar todo o equipamento de camping e essa tarefa
levou um bom tempo.
Às cinco horas da manhã um dos
proprietários apareceu na área e perguntou se estava tudo bem. Ele também se
mostrou surpreso com a chuva repentina. Há muitos dias não caia um pingo de
água na região. O senhor me trouxe uma xicara de café que não foi recusada.
Aproveitei para esquentar o corpo já que a temperatura ambiente era
relativamente baixa.
A chuva perdeu força e às 6 horas
eu estava pronto para começar mais um dia de viagem. Claro que antes de voltar
à estrada eu degustei os últimos pedaços de pão que eu tinha na bagagem. Meu
desayuno foi modesto, mas ainda assim me ajudava a não iniciar o pedal sem
comer nada. Também não me esqueci de agradecer ao dono da casa pela estadia. E
só para não esquecer, seu irmão também se chamava Nelson. Parece que é um nome
bastante comum na região.
O tempo estava nublado quando
comecei a pedalar e não demorou muito para voltar a chover. Eu nem coloquei a
jaqueta impermeável porque achei que a mesma esquentaria demais e a
transpiração seria excessiva. Por isso a minha única preocupação foi em colocar
a capa da bolsa de guidão para proteger, sobretudo, a máquina fotográfica.
A chuva não permaneceu por muito
tempo e continuei tranquilamente a viagem. Quer dizer, tive que encarar um
chato sobe e desce até a cidade de Guamacho. A surpresa deste trecho ficou por
conta de um veículo que parou ao meu lado e os ocupantes perguntaram se era eu
que tinha saído na mídia impressa. Respondi que não, mas o passageiro tampouco
acreditou e me mostrou o jornal com a matéria de um cicloturista venezuelano
que percorria o país. Questionou-me várias vezes se realmente eu não era a
mesma pessoa da foto. O cara somente se conformou quando eu frisei que era
brasileiro. Desejaram boa sorte e continuaram em frente. Fiz a mesma coisa.
Novamente nas alturas.
Caixas d´água na frente das casas é comum na região.
O trajeto depois de Guamacho
mudou e uma longa reta passou a fazer parte da estrada. A essa altura o sol
despontava um pouco tímido e o meu ritmo só não era maior porque o vento contra
insistiu em me acompanhar. Nem me estressei com isso e avancei conforme era
possível. Foi triste ver o número de animais atropelados e mortos na rodovia. A
quantidade é absurda e acredito que muitos são deixados no local após morrerem.
Uma total falta de respeito.
A reta na estrada durou
aproximadamente 15-20 km e quando terminou voltou o sobe e desce acompanhado
com mais chuva. Desta vez as pancadas eram isoladas, mas com um volume de água
muito maior do que anteriormente. Em nenhum momento eu parei por causa da
condição climática. O que me fez estacionar foi outro motivo: a fome.
A chuva me aguardava no final deste trecho.
Ainda não era meio dia quando
resolvi parar na casa de um pequeno vilarejo para pedir a ajuda de alguém para
cozinhar a massa do macarrão. A minha abordagem foi a mesma daquela tentativa
na casa do senhor Antônio. Mas desta vez a resposta foi diferente. A mulher que
me atendeu fez muito mais do que eu esperava. Ao invés de preparar minha
refeição ela me ofereceu arroz e feijão que era a parte do almoço que já estava
pronta. Claro que não recusei e minutos depois eu tinha um prato caprichado em
minhas mãos. Tudo muito simples, mas extremamente saboroso. O tempero do feijão
parecia com aquele da feijoada que a minha mãe faz. Delícia!
Almocei e poucos minutos depois
eu já estava de volta ao pedal. Meu objetivo era avançar o máximo possível em direção
à Valência. O período da tarde foi muito melhor e o pedal rendeu mais do que na
primeira parte do dia. Passei a cogitar a idéia de finalizar o dia na cidade de
Tucacas, bastante famosa por suas praias. Às 16 horas e com 100 km pedalados
perguntei a um motorista de caminhão a distância que faltava para chegar ao meu
destino. O senhor disse que Tucacas ficava a 20 km de onde eu me encontrava.
Essa afirmação me animou e continuei em um ritmo mais forte.
In foco.
Flora e fauna na região de Tucacas.
Na estrada eu tive que fazer uma
parada de emergência. Foi necessário encarar o “matinho” pela segunda vez na
viagem para realizar minhas necessidades fisiológicas. Demorei em encontrar um
lugar mais reservado, mas quando finalmente achei, consegui aliviar a situação.
Voltei literalmente mais leve para o pedal. (Risada sacana).
Esse trajeto antes de Tucacas foi
bastante agradável para pedalar. A vegetação mudou e muitas árvores passaram a
ser visualizadas ao lado da estrada. Inclusive a fauna também tornou-se mais
rica e tive o prazer de ver um casal de araras. O seu grito inconfundível
atravessa fronteiras e foi uma grata surpresa encontra-lo em território
venezuelano.
Pouco depois das 17 horas cheguei
à Sanare e aproveitei para comprar um pão em um restaurante anexo a um posto de
combustível. Eu estava morto de fome e precisa comer alguma coisa e garantir o
jantar. No local eu soube que Tucacas ainda estava a 20 km de distância. O
caminhoneiro tinha se equivocado apenas em 20 km ao me dar a informação. Com a
nova quilometragem eu não teria tempo de chegar ao destino com claridade. Isso
significava que eu já teria que começar a procurar um lugar para ficar.
Descansei uns minutos no posto de
combustível e quando voltei para a estrada percebi que o pneu traseiro estava
furado. Tive que respirar fundo para não desanimar. Porque ninguém merece
trocar pneu após um longo dia de pedal. Consegui seguir até uma casa onde
perguntei se era possível acampar e passar a noite. Expliquei que o pneu estava
furado, mas mesmo assim não tive a permissão. Novamente o cachorro foi a
desculpa descarada. Se a pessoa não pode me receber eu entendo perfeitamente,
só acho muita sacanagem ficar com esse tipo de desculpa. Ainda assim agradeci
pela atenção e continuei mais um pouco, sempre enchendo o pneu para avançar.
Ainda no perímetro urbano de
Sanare eu parei em um posto policial e perguntei se era possível acampar no
local. Eu não tinha muita escolha e por isso tive que recorrer aos “fardados”.
Achei que não teria problemas porque os cicloturistas ingleses que encontrei na
divisa entre Equador e Colômbia me disseram que os policiais venezuelanos eram
bem tranquilos e hospitaleiros. E essa informação realmente se concretizou. Fui
muitíssimo bem recebido e disponibilizaram o quintal de uma casa (em venda) ao
lado do posto policial para eu montar acampamento. Era tudo o que eu precisava.
Montei a barraca e na sequencia
fui trocar o pneu furado. Como a minha câmera de ar reserva estava furada fui
obrigado a remendar as duas. Isso levou um pouco mais de tempo, mas em questão
de uma hora estava tudo devidamente arrumado. Voltei à barraca e finalmente fui
“jantar” pão e suco. Infelizmente não tinha mais bolacha e muito menos geléia.
Não à toa estou bastante magro. Não tenho conseguido repor as energias perdidas
nos últimos dias. Essa cotação oficial tem sido um verdadeiro obstáculo para a
sequencia da viagem.
Dia finalizado com 128,66 km em
9h41m e velocidade média de 13,28 km/h.
23/01/2013 - 199° dia - Sanare a
Guacara
Último dia de pedal ao lado do
Mar do Caribe.
A noite foi bem tranquila e nem
mesmo o barulho dos veículos na movimentada rodovia atrapalhou meu sono. Acho
que a situação também contribuiu bastante. Eu estava ao lado da polícia e
protegido da chuva pela área coberta onde eu havia montado acampamento. Não
tinha com o que me preocupar.
Acordei por volta das 6 horas e
imediatamente comecei a desmontar a barraca e a colocar os alforjes na
Victoria. Fui começar a pedalar somente às 7h30m e sem comer nada. Eu tinha
consciência que passaria novamente ao lado do Caribe e achei que poderia ser
interessante degustar o desayuno com a vista para o mar. Por isso segui em
direção à Tucacas.
Lugar do acampamento ao lado do posto policial em Sanare.
Tucacas apareceu no caminho pela
primeira vez com 12 km pedalados. Na verdade acho que era apenas uma das
entradas distantes da cidade, porque ainda não era possível visualizar o mar.
Mas não precisei avançar muito para me deparar com o belíssimo visual caribenho
e as inúmeras construções ao lado da praia. Até encontrei um acesso para a
areia, mas não achei essa parte muito segura e o policial em Sanare já havia me
alertado sobre isso. Então apenas apreciei o visual e continuei em frente para
encontrar um lugar mais tranquilo para finalmente fazer meu desayuno.
Vegetação densa nas proximidades de Tucacas.
In foco.
Sentido à Caracas
Mar do Caribe ao lado da estrada na região de Tucacas.
No final do perímetro urbano de
Tucacas parei em um ponto de ônibus (quase às 10h da manhã) e fui comer o resto
do pão que tinha sido comprado no final da tarde de ontem. Era um pedaço
generoso e foi degustado rapidamente. Na pretensão de aumentar a glicose no
sangue também aproveitei para preparar um suco bastante concentrado. Acho que a
estratégia funcionou.
Para a minha surpresa a pista
após Tucacas passou a ser duplicada e sem dúvida deixou o pedal mais seguro.
Mas a alegria durou pouco tempo. A rodovia voltou a ficar simples na divisa dos
estados Falcón e Carabobo. A nova região apresentou um ambiente diferente e
mais industrial, sobretudo, voltado à exploração de petróleo.
Pista dupla com acostamento que mais parece uma terceira via.
Chegada ao estado de Carabobo.
Carabobo significa em espanhol: Sabana de Aguas ou Sabana de Quebradas.
Área industrial em Carabobo
In foco.
Nas proximidades de Puerto Cabello.
Puerto Cabello
Pouco antes de Puerto Cabello
fui parado em um posto policial. Mas felizmente queriam apenas saber mais
detalhes a respeito da viagem. O policial mais curioso ainda ofereceu água
gelada para eu completar minhas garrafas e também se mostrou interessado em
ajudar ao mencionar como era o trajeto nos próximos quilômetros. Afirmou que
havia um trecho de 30 km com bastante subida mais à frente. Eu suspeitei desta
distância porque era muita coisa para subir apenas 500 metros, altitude de
Valência, como indicava minha planilha.
De volta à estrada continuei pela
movimentada rodovia e num determinado momento apareceu mais um trevo para
Barquisimeto, ignorei e continuei em direção à Valência e Caracas. Logo na
sequencia cheguei à Puerto Cabello e a viagem seguiu pela Ruta 1 sentido à
capital.
Torcida governamental pela recuperação do presidente.
Primeiros quilômetros pela Ruta 1
Encontrei a saída para todos os problemas. Ficava à direita, rs.
Em função da região portuária, às
margens da rodovia compreendem um número incrível de estabelecimentos
comerciais. A maioria é destinada à alimentação. Eu passei pela região
justamente na hora do almoço e a tentação de parar em um dos incontáveis
restaurantes era enorme. Mas eu não poderia me dar ao luxo de gastar ainda mais
meu pouco e desvalorizado dinheiro. Por isso continuei e fiquei atento para encontrar
uma casa e pedir que o meu almoço fosse preparado.
Ainda na região de Puerto
Cabello um motorista me informou que não tinha nada de subida de 30 km. A
inclinação mais forte seria de aproximadamente 5 km e começava 20 km de onde
estávamos. Fiquei bem mais aliviado com essa nova informação e também porque a Ruta
1 passou a ser duplicada e com um acostamento bastante espaçoso.
Às 13 horas e com 70 km pedalados
eu parei em uma casa para solicitar o preparo da massa da macarronada com
sardinha. O proprietário muito gente boa não pensou duas vezes para autorizar a
minha entrada. Ele pegou minha panela e o macarrão e levou para a sua esposa
cozinhar. Minutos depois eu estava almoçando a simples, porém deliciosa,
refeição. Eu tinha feito um suco, mas também ganhei um copo de chá gelado que
estava divino.
Quando voltei para a estrada meu
objetivo era alcançar o quanto antes a subida de Las Trincheras. O nome é
referência ao povoado que fica no final do aclive. O trajeto para chegar a esse
ponto mais alto do dia não foi dos mais fáceis, contudo, também não apresentou
dificuldades absurdas. Já o aclive esperado realmente faz jus à fama que
recebe. São mais de quatro quilômetros bastante íngremes.
Área de guerra em Las Trincheras, rs. Na verdade o fogo à beira da rodovia acaba com as placas de trânsito.
Depois de Las Trincheras uma
leve descida foi predominante e rapidamente cheguei à região de Valência. Mas
para a minha surpresa a cidade não se encontrava ao lado da rodovia. Era
preciso avançar alguns quilômetros para chegar ao município. No trevo de acesso
eu parei e pensei no que fazer. Isso porque eu havia solicitado hospedagem a um
membro do warmshowers e não sabia sua resposta porque fiquei os últimos dias
sem conferir meu e-mail. Como eu não tinha certeza de quantos quilômetros
precisaria pedalar para chegar à cidade eu achei melhor seguir em direção à
Caracas e parar na cidade de Guacara e tentar encontrar uma hospedagem
econômica.
Montanhas na região de Valencia.
Pôr-do-sol na estrada.
Quando cheguei à Guacara já
estava escuro e precisei pedalar bastante para me deslocar ao centro da cidade.
Pelo caminho foi a minha vez de fazer as perguntas às pessoas nas ruas. Questionava como
chegar à região central e onde eu poderia encontrar um hotel barato. Facilmente
cheguei ao centro e posteriormente na praça principal. No local questionei a
uma senhora sobre uma hospedagem econômica e enquanto ela me indicava a direção
apareceu um cara de moto e disse que o lugar na verdade era um “matadero”, ou seja, um motel não muito recomendável.
Ele me apresentou outra opção e achei mais conveniente seguir sua orientação.
No hotel indicado a diária
custava 200 bolívares, algo em torno de 100 reais na cotação oficial. Foi
impossível permanecer no local em razão do preço. O recepcionista sugeriu outra
hospedagem que poderia ser mais barata. Acabei naquela que a senhora da praça
havia me informado. O lugar era um hotel e motel, mas realmente a diária era
mais barata, 140 bolívares, equivalente a 70 reais. Preço absurdo, mas eu não
tinha muita opção e precisava tomar um banho decente e descansar de verdade.
Maldita cotação!
Não me recordo o nome da
hospedagem, mas não esqueço que foi uma das piores que já fiquei na viagem.
Lençol, fronha, quarto e banheiro, completamente sujos. Uma verdadeira
vergonha. É triste ver sua grana suada sendo gasta em algo deste nível. Para
variar eu soube mais tarde que a diária expirava às 7 horas da manhã.
Inacreditável!
As únicas coisas positivas do
hotel é que tinha ar-condicionado e a Victoria pôde ficar dentro do quarto. Eu
não poderia gastar ainda mais dinheiro e por isso solicitei a utilização da
cozinha para preparar meu macarrão. Achei que meu pedido seria recusado, mas
consegui autorização e rapidamente a massa estava cozida e então voltei ao
quarto para adicionar os demais ingredientes e matar a fome. Esperei um tempo e
depois fui dormir, finalmente sem barulho de veículo.
Dia finalizado com 117,61 km em
8h33m e velocidade média de 13,73 km/h.
24/01/2013 - 200° dia - Guacara a
Paracotos
E a expedição chega aos 200 dias
de muitas aventuras, histórias, descobertas, aprendizados e toda uma América do
Sul pelo caminho.
A noite no hotel foi tranquila e
acordei somente uma vez durante a madrugada para desligar o ar-condicionado que
deixou o ambiente bastante frio. Depois levantei por volta das 6 horas e
arrumei as minhas coisas para sair no horário estipulado pelo estabelecimento.
Eu havia deixado um pouco de macarrão para o desayuno de hoje, mas achei melhor
degusta-lo na hora do almoço.
Após minha saída do hotel fui a
uma padaria para comprar alguma coisa para comer. A opção mais “barata” foi um
pão tipo baguete. O balcão estava repleto de tentações, mas infelizmente eu não
poderia levar nada do que estava ao alcance dos meus olhos. Achei melhor
desayunar somente na estrada, por isso direcionei-me à saída para Caracas.
Ainda no centro de Guacara fui à
lan house, mas a mesma abriria somente em 2 horas. Era muito tempo para esperar
e acabei por ficar sem contatar o membro do warmshowers que me receberia em sua
casa e guardaria a Victoria durante minha visita ao caribe venezuelano.
Na saída da cidade me deparei com
um congestionamento quilométrico no outro lado da rodovia (sentido Caracas x
Valência). Ainda bem que a pista dupla continuou com um largo acostamento.
Aproveitei a sombra de uma árvore no caminho e preparei um suco para o desayuno
com o pão comprado minutos atrás.
Com a barriga menos vazia comecei
o pedal em direção à Caracas. A distância até a capital era uma incógnita
porque meu planejamento inicial passava por outros caminhos e a planilha não
apontava com exatidão a quilometragem entre as duas cidades. Por isso o
objetivo era avançar o máximo possível.
O trajeto inicial e o vento
moderado favoreceu o deslocamento e a pedalada seguiu sem maiores dificuldades.
Mas não demorou muito e a rodovia no sentido que eu estava começou a ficar
congestionada. O problema é que o acostamento foi tomado pelos motoristas e
acabou por se transformar em uma terceira via. Resultado é que eu não tinha
opção a não ser passar em um dos corredores formados pelos veículos.
Ultrapassei centenas deles já que o congestionamento permaneceu por vários
quilômetros.
O que causava o congestionamento
era uma barreira policial realizada antes de um túnel. Quando notei a presença
da polícia já pensei que novamente minha passagem não seria autorizada, mas
nenhuma obstrução foi colocada e pude avançar normalmente.
Após o túnel eu estava em outro
estado, denominado Aragua e que não trouxe muitas novidades. Avistei mais
veículos queimados à beira da estrada e desta vez não deixei de registra-los.
No decorrer do caminho encontrei uma barraca que vendia manga, mas infelizmente
o preço de uma custava 5 reais. Argumentei ao vendedor que eu estava com fome
(de verdade!), mas não tinha dinheiro para compra-la. Disse isso na maior
naturalidade e acho que soou um pouco dramático e então ganhei duas frutas.
Fiquei feliz demais e na primeira sombra que encontrei parei para degusta-las.
Pedalando pelo estado de Aragua
Paisagem
Cena comum: Carro queimado ao lado da estrada.
Após "depenar" o veículo os ladrões colocam fogo para não deixar nenhuma pista.
In foco.
E a vegetação continou bastante seca.
Ainda é preciso avançar muito em relação à agricultura. 70% dos alimentos ainda são importados.
Não demorou muito e logo eu
estava em Maracay, um dos principais destinos turísticos do país e porta de
entrada para as principais praias localizadas no Parque Nacional Henri Pittier.
Mas como eu ainda não visitaria a cidade, apenas continuei em direção à
Caracas. Destaque ficou por conta da imensa obra do Tren Simón Bolívar que está em construção. Trata-se de uma linha
férrea que deve ligar a região leste a oeste do país. Cartazes exibem que esta
é mais uma obra da revolução para o povo venezuelano. Meio de transporte
alternativo, gostei da iniciativa.
Ferrovia (à direita) em construção.
O socialista é frequentemente reforçado nas campanhas publicitárias.
Após Maracay uma placa informava
que faltavam praticamente 100 quilômetros para Caracas. Seria muito difícil
chegar à capital no mesmo dia. De qualquer forma continuei pedalando forte para
avançar até o final da tarde.
Menos de cem quilômetros para chegar à capital venezuelana.
Com a estrada em boas condições e
sem maiores problemas com o vento, rapidamente cheguei à La Victoria onde
resolvi parar em um parquinho de criança à beira da estrada e degustar o almoço
que na verdade era a sobra da janta do dia anterior. A área tinha bastante
sombra e foi um lugar tranquilo para realizar a refeição que estava bastante
saborosa apesar de fria. Um suco ajudou a comida a descer com mais facilidade.
Adesivo que estava em um veículo estacionado na frente do parque infantil.
Descansei um pouco e quando
estava prestes a retornar à estrada perguntei a um homem (Suhael) se o centro
de La Victoria estava muito longe por que eu precisava, com certa emergência,
utilizar a internet. No caso eu necessitava avisar meu contato de Caracas sobre
a minha chegada no dia seguinte. O Suhael disse que eu poderia utilizar a
internet de sua casa que ficava bem na frente do parquinho. Que maravilha!
Na casa eu cumprimentei toda a
família e logo me tornei o centro das atenções. Todo mundo procurou tirar uma foto
comigo para recordação, inclusive as crianças que estavam uniformizadas para o
treino de beisebol. O esporte é um dos mais praticados na Venezuela e não à toa
na parede da sala havia um quadro de cada menino com a vestimenta do seu clube
preferido. Aqui beisebol é uma “paixão nacional” na mesma proporção que o
futebol é para o brasileiro, acredite se quiser.
Com os pequenos jogadores de beisebol.
Na internet ao invés de mandar um
e-mail ao anfitrião de Caracas eu achei melhor anotar o seu telefone e ligar para
avisar sobre a minha chegada. O pessoal da casa estava de saída e por isso fiz rapidamente
o que tinha para fazer, me despedi da família e agradeci pela ajuda. Antes de
partir o Suhael não me recomendou parar em Tejerias (20 km) por ser uma cidade
perigosa e sugeriu que eu ficasse em alguma hospedagem em La Victoria para
seguir na manhã seguinte.
Era muito cedo para finalizar o
pedal em La Victoria e eu não estava disposto a gastar mais dinheiro com
hospedagem. Também não ignorei o aviso sobre Tejerias e resolvi que seguiria
para Paracotos que ficava há quarenta quilômetros de onde eu estava. Distância
que poderia ser facilmente pedalada até o final da tarde.
Na estrada o relevo que estava
praticamente plano desde o final da subida de Las Trincheiras, começou com o
velho sobe e desce. Quando cheguei à Tejerias observei várias casas localizadas
nos morros ao redor da cidade, cenário muito parecido com aquele das favelas do
Rio de Janeiro. Acho que por isso o Suhael não me recomendou permanecer no
local.
O enaltecimento de Bolívar está em todos os lugares.
In foco.
In foco.
Nas proximidades de Tejerias tive
uma surpresa que realmente eu não esperava. Um automóvel Ford Ka estava parado
no acostamento e assim que eu passei o motorista pediu para eu estacionar a
bicicleta. Em nenhum momento desconfiei da abordagem e por isso parei. O homem
perguntou apenas a minha nacionalidade e na sequencia me ofereceu água para
completar as garrafas. Sem muita curiosidade, a tal pessoa, como quem afirma
alguma coisa, disse: Você está precisando de dinheiro, né!? Sem me deixar
responder ele coloca a mão no bolso, pega a carteira, separa 100 bolívares (+-
R$ 50,00), me entrega e vai embora. Quase não tive a chance de agradecer. Tudo
muito rápido e estranho.
Algumas coisas nesta vida fogem
do nosso entendimento. Fiquei muito tempo pensando sobre esse acontecimento da
doção em “espécie” na estrada. Pela primeira vez em mais de seis meses de
viagem algo deste tipo acontece, justamente em um momento financeiro bem
delicado. Este episódio me fez lembrar muito do livro: Por onde caminham os anjos de Joan Wester Anderson. A obra menciona
histórias supostamente reais de fatos aparentemente sem explicação lógica,
porém, relacionados com algo mais espiritual. Não sei a que ponto isso também
pode ter alguma relação com o que se passou comigo. Em todo caso eu fiquei
extremamente agradecido pela ajuda recebida.
Continuei o pedal em direção à
Paracotos e a surpresa agora foi encontrar mais uma divisa de estado. Com quase
100 km pedalados desde Guacara, a viagem passou a acontecer por Miranda.
Avancei mais um pouco e finalmente cheguei ao meu destino. Até cogitei procurar
uma hospedagem mais econômica, mas não existe estabelecimento deste tipo na
região. Fui obrigado a buscar um lugar para acampar, de novo.
Ruta 1 no estado de Miranda.
Na divisa entre Aragua e Miranda.
Em Paracotos há um posto da
Seguridad Vial, algo parecido com a nossa polícia rodoviária. Relutei em não
permanecer no local, mas sem alternativa fui solicitar a autorização para os
devidos responsáveis. Infelizmente o chefe não possibilitou a minha presença no
pátio, contudo, eu poderia montar acampamento do lado de fora. A sugestão não
me pareceu uma boa idéia, mas como disse, não havia muito que fazer e por isso
a solução foi ficar nesta área concedida. Ao menos eu achei que estaria seguro,
afinal a polícia estava logo ao lado.
Pouco depois das 18 horas meu
acampamento estava levantado e assim que acabei de colocar meus alforjes no
interior da barraca apareceram dois policiais e surpreendentemente perguntaram
se era fácil transportar minhas coisas para o pátio onde eu poderia ter mais
tranquilidade. Eu respondi que a mudança era fácil de ser realizada e então os
homens disseram que eu precisava apenas esperar o chefe terminar o expediente.
Eu aproveitei que tinha esse
tempo disponível antes de fazer a mudança e fui a um restaurante nas
proximidades do posto policial. Eu estava com muita, mas muita fome e precisava
comer pelo menos um prato de arroz. Quando cheguei ao local descobri que o
estabelecimento servia apenas comidas rápidas: pizza e pollo broaster. Fiquei
muito tentado a comprar uma pizza média que saía em torno de 30 reais. Mas era
muita grana para uma pizza e por isso pensei uma, duas, seis, dez vezes se
realizava ou não o pedido.
Perguntei ao atendente se havia
algum desconto na pizza e então ele questionou o quanto eu tinha de dinheiro,
respondi que estava com pouca grana e muita fome. Rapidamente expliquei que
estava viajando de bicicleta e continuei pensando no que fazer. Foi então que o
rapaz disse que havia sobrado um broaster (frango frito) e se eu quisesse
estaria à minha disposição. Claro que eu não recusei. Consequentemente ele me
entregou uma bandeja bem caprichada com o referido alimento. Mal acreditava que
também havia conseguido ganhar a minha refeição.
Assim que saí do restaurante abri
a bandeja e devorei um pedaço de frango. Que delícia! Não lembro de ter me
deparado com alguém na rua, mas se por ventura fui flagrado em tal ato
desesperado, certamente me confundiram com um mendigo morto de fome. Não estava
nada preocupado com isso, queria mesmo era saciar minha fome.
Voltei para o acampamento e
sentei em uma mesa que havia num quiosque ao lado do posto policial. Neste espaço
fiz a minha refeição na companhia de uma cachorra vira-lata. Estava difícil
saber quem estava com mais fome. Eu terminava um pedaço de frango e jogava o
osso para ela que conseguia devora-lo em tempo recorde. Foi uma cena bonita de
ver. O animal ficou quietinho na espera dos outros ossos, tinha certeza que ganharia
mais tão logo eu terminasse de comer a minha parte. No final ambos estávamos
quase satisfeitos, aposto que nós dois ainda devoraríamos outra bandeja sem
maiores dificuldades. (Risada Sacana).
Neste mesmo quiosque onde fiz a
refeição tinha um homem que alugava o telefone para fazer chamadas a 1 bolívar
o minuto. Era finalmente a minha chance de tentar contatar o anfitrião de
Caracas e avisa-lo que muito provavelmente eu estaria na capital na manhã
seguinte, afinal eu me encontrava a menos de 50 quilômetros de distância. Mas
ninguém atendeu o telefone e eu fiquei sem saber como seria minha recepção em
Caracas. Não tinha a mínima idéia de como chegar até o endereço que eu havia
anotado na agenda, sobretudo, porque não constava o número da residência. Paciência!
Apostei que tudo daria certo no dia seguinte e voltei à barraca para fazer
minha mudança para o pátio da polícia.
A mudança ocorreu rapidamente e
precisei de poucos minutos para estar devidamente alojado na área destinada à
minha permanência. A única condição era que a minha saída ocorresse bem cedo no
dia seguinte para que o chefe não notasse a minha presença. Sem problema,
acordar nas primeiras horas da manhã tem sido algo bem frequente nesta viagem.
Fui dormir o sono dos justos.
Dia finalizado com 118,60 km em
8h09m e velocidade média de 14,52 km/h
25/01/2013 - 201° dia - Paracotos
a Caracas
Finalmente na capital
venezuelana.
A noite foi incrivelmente
tranquila na medida do possível. Eu estava à beira da Autopista cujo o
movimento não é interrompido nem por um minuto e mesmo assim eu consegui dormir sem
maiores dificuldades. Que beleza!
Coloquei o celular para despertar
às 5 horas da manhã e levantei assim que o mesmo tocou. Rapidamente comecei a
guardar todos os equipamentos. Uma hora depois, ainda dentro da barraca, ouvi a
voz de um dos policiais me chamando. Ele pensou que eu ainda estava dormindo e
deve ter ficado surpreso com a minha resposta imediata dizendo que em questão
de minutos eu estava de saída.
Ao desmontar a barraca tive uma
constatação nada boa, uma vareta quebrou e por enquanto não sei como vou fazer
para a mesma voltar a ser útil. Em todo caso acho que terei um tempo para
pensar em alguma solução, ainda que seja uma gambiarra.
Às 6h30m estava pronto para
começar o pedal final em direção à Caracas. Mas antes de voltar à estrada fiz
questão de agradecer os policiais que me concederam o espaço para eu passar a
noite, mesmo sem autorização do chefe.
Não choveu durante a noite, mas o
dia amanheceu um tanto nublado, contudo, somente o fato de não ter vento já me
animava para completar a subida final. Caracas está a mais de 900 metros de
altitude, ou seja, eu ainda encontraria um forte aclive pelo caminho, embora o
policial tivesse me informado que o trajeto seria plano. Fui conferir.
Pouco depois do posto policial
fui obrigado a parar em outro posto, desta vez, de combustível, precisava
abastecer meu motor, isso é, necessitava desayunar alguma coisa. No local havia
várias barracas onde vendedores preparavam arepas
recheadas. Não era algo muito barato, custava 30 bolívares, mas eu não tinha
escolha, meu estômago estava vazio e como diz o ditado: saco vazio não para em
pé. A arepa solicitada estava com molho de salsicha. Uma delícia, pena que
acabou rápido demais. Acredito que seriam necessárias dez arepas para saciar
essa fome quase sem fim.
De volta à estrada eu ficava sem
entender o comentário do policial a respeito do relevo. Não havia exatamente
nada de plano. A inclinação ficou cada vez mais acentuada e não à toa me fez
lembrar a Cordilheira dos Andes. A brincadeira inicial resultou em 15
quilômetros montanha acima. Ainda restavam 25 quilômetros para chegar à
capital, mas não tinha certeza de quanto ainda precisaria subir. Por isso
aproveitei que um caminhoneiro consertava seu veículo no acostamento e
perguntei sobre o trecho a seguir. A resposta não foi das mais animadoras,
ainda restavam 7 quilômetros montanha acima.
Novamente nas alturas.
Autopista em direção à Caracas.
Com a mudança do relevo, também a
paisagem passou a ser diferente, mais uma vez eu tinha a oportunidade de
contemplar o horizonte do alto da montanha. O panorama é sempre espetacular,
ainda que o tempo não contribuísse muito para isso. De qualquer forma foi
possível encarar o resto da subida e apreciar aquilo que estava ao meu redor.
A estrada ficava para trás.
Quase no final da subida eu tive
mais uma surpresa nesta viagem. Esta mudaria boa parte dos meus planos no
decorrer do dia. Enquanto me esforçava para concluir a última parte da ascensão
percebi que uma mulher me observava e fazia registros fotográficos. Ela estava
em seu veículo estacionado no acostamento e quando me aproximei solicitou a
minha parada.
A mulher em questão era a Ana
Maria que se direcionava à Caracas. Sua abordagem foi por meio de uma pequena
entrevista filmada. Ela fez as mesmas perguntas que estou acostumado a
responder, contudo, desta vez estava tudo sendo gravado. Para não fazer feio
procurei caprichar no espanhol. Acho que saiu tudo certo.
Era possível notar que a Ana
Maria estava surpresa com a minha presença e a forma como eu havia completado a subida pedalando. Ela mencionou que, junto com seu marido, também
andava de bicicleta, mas nada comparado ao que eu fazia. Perguntou ainda se eu
tinha um contato na capital e então eu expliquei que tinha, mas não conseguia
encontra-lo. Ela então me passou vários números de telefone e pediu que eu
ligasse assim que estivesse em Caracas. Disse que seu marido certamente
gostaria de me conhecer, uma vez que ele é jornalista e poderia fazer uma
matéria a respeito da viagem. Achei a idéia incrível e fiquei de entrar em
contato.
Ana Maria mencionou também que
mais à frente haveria um túnel onde eu deveria ter muito cuidado porque o
espaço era limitado e que os motoristas não costumavam respeitar os
ciclistas. Pensei que seria mais uma parte onde a minha passagem não seria
permitida, mas ela disse que o local não era vigiado pelos policiais, ou seja,
isso não seria um problema para o meu avanço. Nos despedimos e cada um seguiu,
à sua maneira, para a maior cidade do país.
O túnel Los Ocumitos apareceu
aproximadamente 25 quilômetros após a saída de Paracotos. Realmente nenhum
policial se encontrava no local e por isso continuei o pedal na intenção de
atravessar a passagem subterrânea o quanto antes. A autopista é demasiadamente
movimentada e o barulho no túnel estava realmente assustador. Precisei ter
muito sangue frio para não me desequilibrar e ser atropelado pelos veículos que
passavam a poucos centímetros da Victoria. Foi tenso. Para a minha sorte a
extensão da obra não passou de 2 quilômetros.
Túnel Los Ocumitos
O túnel praticamente marca o
final da subida. Após a passagem assombrosa precisei apenas percorrer mais um
curto trecho de ascensão para começar a descida em direção à Caracas. Poucos
minutos depois eu visualizava os primeiros prédios da capital. Estava quase no
meu destino.
A primeira imagem da capital venezuelana.
O trânsito na entrada da cidade
era intenso e realmente eu não esperava algo diferente. Acostumado a pedalar
com esse tráfego eu apenas precisei aumentar a atenção e seguir as placas em
direção ao centro. Minha estratégia é sempre me direcionar à região central
para encontrar as melhores opções de hospedagem e alimentação. No caso de
Caracas seria um local ideal para servir como referência aos meus contatos sobre a minha
localização.
Enquanto pedalava em direção ao
centro observava as favelas de Caracas, diferente da maioria das outras
capitais sul-americanas, elas estão localizadas nos morros na entrada da cidade
e é quase impossível passar despercebido com tal presença. Interessante foi
visualizar algumas casas com cores bem chamativas no alto da montanha e que sem
dúvida deixa o ambiente mais agradável.
Locomover de bicicleta pelas
capitais exige atenção, mas não é um bicho de sete cabeças como muita gente
pensa. Claro que ficamos mais expostos aos acidentes, uma vez que a quantidade
de veículos é extremamente maior do que em outras cidades, todavia, se você
souber se comunicar com o motorista é possível chegar ao local desejado sem
maiores problemas. Eu procuro sempre sinalizar minha mudança de faixa ou direção utilizando as mãos. Uma medida simples e que ajuda todo mundo a
se entender melhor. Claro que às vezes aparece um e outro sujeito mais
apressado e que não respeita nada, mas em Caracas isso foi realmente praticado
por uma minoria.
Pelas avenidas movimentadas de Caracas.
Segui a placas e a orientação de
algumas pessoas e pouco antes do meio dia estava na Avenida Bolívar ao lado do
Parque Central. Parei em uma praça e fiquei pensando sobre o que fazer. Tentei
ligar para o contato do warmshowers, mas novamente ninguém atendeu o telefone.
Fiquei um pouco receoso de chamar a Ana Maria e/ou seu marido naquele horário,
mas eu precisava de ajuda para que a minha estadia na capital não terminasse
com meu saldo bancário.
Liguei para um dos números que a
Ana Maria havia me passado e quem atendeu foi o seu esposo Juan José. Comecei a
explicar que tinha encontrado com a sua mulher na estrada, quando ele mencionou
ter visualizado as fotografias. Na sequencia se dispôs a me encontrar em uma
hora no Parque Central.
Fiquei na calçada de um
movimentado cruzamento à espera do jornalista. Eu não tinha certeza se ele
realizaria a entrevista naquele instante, me ajudaria com hospedagem ou
qualquer outra coisa. Importante é que eu tinha com quem contar e isso sempre
faz a diferença, sobretudo, em um lugar que você está pela primeira vez.
A minha fome já era incrível
àquela hora do dia e o lugar onde eu estava era o mesmo escolhido por vários
trabalhadores para devorarem suas marmitas. O cheiro de comida me deixava com
ainda mais fome. Acho que a situação chegou a um ponto que se alguém oferecesse
a sobra do almoço eu não negaria. De qualquer forma procurei manter a calma e
apenas observar todo o movimento de pessoas e veículos.
Dizem que a Venezuela é o país
das mulheres bonitas. A fama talvez seja pelos famosos concursos de miss aqui
existentes. Por mais de uma ocasião a mulher venezuelana foi considerada a mais
bonita do mundo. Mas sinceramente eu não sei onde elas se esconderam, porque
até agora eu não encontrei tal beleza. Quem sabe nos próximos dias.
Ficar parado no cruzamento me
deixou sonolento e com ainda mais fome, mas um acidente entre um motociclista e
um taxi, praticamente ao meu lado, me despertou rapidamente. Aqui é notável a
presença massiva de motociclistas e assim como acontece em São Paulo, logo após
o acidente vários motociclistas estavam reunidos em defesa do envolvido na batida e que
se encontrava estirado no chão e aparentava sentir muitas dores. Começou uma
confusão e o pessoal foi tirar satisfação com o motorista do taxi. Acho que
teve até agressão física.
O choque entre os veículos atraiu
vários curiosos e o trânsito ficou ainda mais caótico e não seria exagero dizer
infernal. Foi exatamente neste momento que fui abordado pelo Guillermo Vargas
que se identificou como amigo do Juan, que por sua vez, havia solicitado para
que ele viesse ao meu encontro.
Guillermo também é ciclista e
recentemente havia encontrado com um cicloturista mexicano ao qual conseguiu um lugar para sua estadia em
Caracas. Pelo o que eu entendi ele me encaminharia para esse mesmo local.
Todavia aguardamos a chegada do Juan que apareceu minutos depois com a Ana
Maria.
Foi muito bom rever a Ana Maria e
conhecer o Juan, opositor convicto ao governo Chávez. Ele não deixou de tecer
criticas ao presidente e o socialismo de “fachada” que, segundo ele, é
praticado desta forma apenas para angariar votos.
Independente da posição política,
ambos, incluindo o Guillermo, me pareceram pessoas realmente dispostas a me
ajudar no que viesse a ser necessário. Eu acabara de conhecê-los, mas me sentia
entre amigos de longa data. Já passava das 13 horas e ninguém tinha almoçado,
portanto, começamos a procurar um restaurante para fazer a refeição. Eu
particularmente não via a hora disto acontecer.
Os maiores edifícios da capital
estão localizados na região do Parque Central que também compreende os mais
importantes museus da cidade, além de um variado comércio. Desta parte da
cidade é possível ver o recente teleférico utilizado pelos moradores do morro
como meio de transporte alternativo para chegar ao centro. Mais uma obra da
“revolução”.
Em um dos centros comerciais
encontramos um restaurante mais sofisticado do que estou acostumado a
frequentar. A Victoria teve autorização para entrar no estabelecimento e foi
estacionada no depósito. Eu não estava nada limpo e tampouco cheiroso para a
ocasião, mas ninguém pareceu se importar com isso. Acho que na verdade todos
estavam com fome e por isso fizemos logo o pedido.
No cardápio não tinha nada muito
barato e muito menos algum prato que acompanhasse arroz. Então a escolha foi
por uma sopa, frango assado e hallacas. Estava tudo delicioso. A sopa foi uma
das melhores que provei em seis meses no exterior. Fui o último a terminar o
almoço. Não neguei que estava com fome. A conta? Não sei quanto foi porque o
Juan fez questão de pagar a refeição de todo mundo.
O cardápio caprichado. Destaque para as tipicas hallacas.
O dia em que a Victoria entrou no restaurante para me acompanhar no almoço.
In foco.
Após o almoço fui a uma lan house
para mandar um e-mail para o contato do warmshowers já que por telefone não
obtive resultado. No mesmo prédio o Juan parou em uma loja e me presenteou com
uma camiseta com os dizeres: Yo amo
Venezuela. Para completar ainda passamos em uma tienda de dulces e
compramos umas guloseimas, novamente não precisei pagar.
O Guillermo precisou realizar
algumas tarefas e o casal ficou incumbido de me levar ao local onde o
cicloturista mexicano estava. O local não ficava próximo de onde nos
encontrávamos e por isso precisei pedalar um bom trecho pelas ruas e avenidas
movimentadas. A regra era seguir o carro do Juan.
Durante o caminho passamos por
algumas áreas importantes da cidade e sempre que alcançava o veículo eu recebia
informações sobre o local pelo qual acabara de conhecer. Na praça O’Leary
paramos, por recomendação do Juan, que registrou minha presença em um dos
lugares mais simbólicos de Caracas.
Plaza O'Leary na urbanização El Silencio.
Plaza O'Leary.
O trânsito da capital é bem
complicado e não raramente está engarrafado, muitas vezes tive que seguir
espremido entre os veículos. Em determinados momentos o carro dirigido pela Ana
Maria disparava na minha frente e escapava ao meu campo de visão, mas na
sequencia eu encontrava-o estacionado à minha espera. Mas uma hora acabamos por
nos perder. Na dúvida eu achei melhor seguir as placas que indicavam o nome do
bairro (La Vega) onde o outro cicloturista estava. Entretanto, avancei e não encontrei
nem sinal do casal. A solução foi pedir um telefone emprestado para saber onde
eles estavam. Para a minha felicidade não precisei voltar muito e no local
combinado facilmente nos reencontramos. UFA!
A vida de cicloturista nas grandes cidades.
A solução é avançar entre os veículos.
A cara de cansado era o resultado de um pedal extremo entre Maracaibo e Caracas.
La Vega - Reduto Chavista
La Vega - Reduto Chavista
Na verdade não estávamos indo ao
encontro do cicloturista e sim a um lugar que o Guillermo ficou de nos
encontrar para então me levar ao local onde eu ficaria hospedado. Não demorou e
o Guillermo apareceu. Estava na hora de me despedir do casal e agradecer por
toda a ajuda e atenção. A recepção inesperada não poderia ter sido melhor.
Juan e Ana Maria
O lugar ao qual eu fui
direcionado pelo Guillermo na verdade se tratava de uma obra em construção
bastante interessante. Há pouco tempo o terreno onde hoje está sendo levantado
vários prédios era baldio e passou a ser requisitado por um grupo de famílias
que junto ao governo propôs se organizar e oferecer a própria mão de obra para
a construção de suas moradias. O governo então cedeu o terreno, material e
auxilio técnico para tornar realidade o sonho da casa própria de quase cem
famílias.
Campamento Kaika-Shi
In foco.
Campamento Kaika-Shi
Chavistas ao extremo.
A construção dos prédios deve ser finalizada em 18 meses.
A obra de um outro ângulo.
Campamento Kaika-Shi
A Victoria ao lado do refeitório.
As famílias estão divididas em
grupos e cada dia um deles é responsável pelo andamento da obra, segurança do
local e a refeição dos trabalhadores. É um processo extremamente organizado que
eu pude conferir com meus próprios olhos. Como mencionou um dos integrantes,
não existe um líder especifico porque esse processo de conscientização,
organização e dedicação é tarefa de todos em prol à obra e ao ideal socialista.
Foi ressaltado que essa mobilização não é fácil, mas que aos poucos o projeto
ganha cada vez mais força.
Era neste lugar que o mexicano, também
chamado Guillermo, estava a mais de uma semana. Com mais de 40 anos de idade ele saiu do
Canadá, desceu pela América Central e agora pedala pela América do Sul.
Continuará na Venezuela até o presidente Chávez retornar ao país. Não entendi
muito bem, mas ao que me parece ele deseja encontrar o mandatário venezuelano.
Guillermo é um cara muito simples e com pouco dinheiro. Faz pequenos trabalhos
para prosseguir com a viagem. Aqui no acampamento ele encontrou uma
oportunidade de colaborar voluntariamente com as famílias e assim
executar algumas tarefas na construção dos prédios. Desta forma ele recebe alimento e
abrigo em uma parte do refeitório.
O Guillermo Vargas, que indicou o
mexicano a este lugar, entrou em contato com uma conhecida do acampamento e
explicou a minha situação. Como eu precisava apenas de um lugar para passar a
noite, não hesitaram em me ajudar. No local eu fui muitíssimo bem recebido e
achei bastante interessante toda essa organização e autogestão das famílias.
Após muito tempo de conversa fui
tomar um banho. Mais uma vez foi no esquema do balde. O importante é que eu
fiquei limpo. Posteriormente fui convidado a jantar. A refeição era simples,
arroz e almondegas, mas para mim era mais do que o suficiente.
Aos poucos o grupo responsável
pela segurança do acampamento apareceu e o local ficou mais movimentado.
Conversei bastante com o pessoal e depois fui dormir em um dos colchões
disponíveis. Precisei apenas pegar meu saco de dormir para não passar frio
durante a madrugada. Como o lugar é coberto não necessitava me preocupar com a
chuva, caso ela resolvesse cair.
Sem dúvida foi mais um dia
inesquecível por todas as pessoas que apareceram no meu caminho e também pelas
coisas interessantes que eu aprendi a respeito da Venezuela, seja através
daqueles que apoiam o governo ou por meio de seus opositores. Acho que analisar
os dois lados é a melhor forma de ter uma idéia melhor sobre o que acontece em
determinado lugar. Por isso me considerei um privilegiado por conseguir acesso
para transitar em ambas as partes.
Dia finalizado com 60,83 km em
5h29m e velocidade média de 11,09 km/h.
26/01/2013 - 202° dia - Caracas
(Folga)
A noite foi relativamente
tranquila. Apenas em um momento precisei levantar para passar o repelente
(raramente utilizado) contra os pernilongos que aqui foram chamados de pragas pelo pessoal. Depois de passar o
creme não tive mais problema com eles e a madrugada se destinou a recuperar as
energias.
A galera acordou cedo no
acampamento e pouco depois das 6 horas da manhã a maioria já estava de pé para
começar mais um dia de trabalho. Sábado é o dia da semana que reúne mais
voluntários e eles não tardaram a chegar.
Eu tinha um objetivo na parte da
manhã, acessar a internet e ver se finalmente o contato do warmshowers poderia
me receber. Infelizmente a lan house abriu somente após às 9 horas. Ao entrar no
meu e-mail a notícia não foi das melhores e a tal pessoa não poderia me receber
porque sua casa estava em reformas, contudo, frisou que poderia guardar a
Victoria pelo tempo que fosse necessário. Sem tempo a perder anotei as outras opções da
rede de hospitalidade para cicloturistas e comecei a ligar para cada uma delas.
Daqueles números dos membros do
warmshowers de Caracas, somente um me atendeu e não ajudou muito porque o
participante da rede estava em uma viagem em direção à Ushuaia e sua família
não poderia me receber. Paciência.
Voltei ao acampamento, tomei o desayuno
servido pelas famílias e logo na sequencia o Guillermo Vargas apareceu e tentou
me ajudar com hospedagem, mas infelizmente ninguém conhecido se dispôs a me
receber. Eu até poderia continuar no acampamento, mas eu tinha plena
consciência que o local não era uma hospedagem e sim um local de trabalho, como
eu não tinha tempo para ajudar, não queria me aproveitar da boa vontade deles
sem oferecer nada em troca. Sem contar que o ambiente não era nada propicio
(durante o dia) para descansar e escrever. Eu precisava atualizar o diário de
bordo.
Com todas essas questões
mencionadas acima eu resolvi que após o almoço eu procuraria uma hospedagem na
região central. Combinei de ligar para o Guillermo Vargas no dia seguinte para
saber se ele havia conseguido alguma hospitalidade. No acampamento a refeição
do meio dia foi sopa de carne com suco. Tudo muito simples, mas saboroso.
Logo após o almoço eu me despedi
do mexicano e todo o pessoal e voltei às ruas com a Victoria. Lembrei do
caminho feito no dia anterior e por ele eu retornei ao centro. Cinco
quilômetros depois eu estava na praça O’Leary onde o Juan havia realizado um
registro fotográfico comigo e a minha companheira.
Na região do centro eu comecei a
procura por hospedagem. Na primeira tentativa não havia mais quarto disponível.
Já na segunda opção eu tive uma baita surpresa. Na Hospedaje Gran Avila na Avenida
Lecuna a diária custava 70 bolívares, equivalente a 35 reais. Com a maldita
cotação esse foi o valor mais baixo que eu encontrei até agora. Quando o
recepcionista me falou eu nem acreditei, mas era mesmo esse preço. Não pensei
duas vezes em ficar no lugar. Nem mesmo precisei ver o quarto antes de pagar,
importante é que na atual situação estava “barato” e eu não poderia perder a
oportunidade.
A Victoria ganhou autorização
para entrar no dormitório, mas como o mesmo ficava no segundo piso eu tive que
tirar toda a bagagem para subir as escadas. O quarto é um dos menores que eu me
hospedei durante a viagem. Não tem ventilador, ar-condicionado e televisão,
apenas uma cama. Parece uma cela de prisão, inclusive o imenso corredor externo
também nos remete a tal comparação.
Apesar da aparência de presidio
até que o ambiente é tranquilo e não poderia ser muito diferente. Um cartaz na
entrada do hotel deixa claro que somente é aceito Caballeros que mantenham a
ordem e distinção. O ruim disso tudo é que a maioria dos homens são porcos e
desleixados e assim os banheiros, que são compartilhados, não raramente estão
sujos, apesar da constante limpeza. Paciência!
No período da tarde eu fui ao
supermercado para ficar ainda mais pobre. Mas infelizmente eu tive que
desembolsar uma grana para não passar fome. Comprei pão, geléia, suco, leite,
chocolate em pó, banana e atum. Este último foi para a cestinha porque minutos
antes eu havia encontrado um cartucho de gás para o fogareiro ao preço de 60
reais. O preço maior estava relacionado ao tamanho que era equivalente a dois
botijões daqueles que eu estava acostumado a comprar.
Voltei para o hotel todo feliz
porque finalmente eu poderia comer alguma coisa mais nutritiva e diferente. E
além de tudo eu achei que tinha feito um bom negócio com a aquisição do gás,
pois economizaria bastante ao fazer minha própria comida. Mas a alegria com
relação a isso durou pouco. A boca do gás foi incompatível com o meu fogareiro
por questão de milímetros. No mesmo instante voltei à loja de esportes e
mostrei que as peças não se encaixavam e o funcionário aceitou a devolução e me
entregou o valor total que eu havia investido. Menos mal.
Regressei à hospedagem, degustei
algumas das coisas que comprei no mercado e depois fui ver um filme no
computador. Merecido descanso.
Dia finalizado com 5,39 km em
0h26m e velocidade média de 12,38 km/h.
27/01/2013 - 203° dia - Caracas
(Folga)
Dia reservado para conhecer um
pouco melhor a capital venezuelana.
Acordei cedo, preparei o desayuno
e por volta das 8 horas fui caminhar pelas ruas e avenidas de Caracas para
descobrir suas riquezas culturais, arquitetônicas e históricas.
Talvez o melhor dia para se
conhecer qualquer cidade com mais tranquilidade seja domingo, sobretudo, pela
parte da manhã. A calmaria, o silêncio e o tráfego menor de veículos e pessoas
possibilita uma caminhada mais bem aproveitada. É possível observar com mais
calma, pensar e sentir o clima de tudo aquilo que está ao seu redor.
Eu sabia que estava próximo da
Plaza Bolívar, uma das principais do centro da cidade, mas não tinha idéia que
ela se localizava há apenas algumas quadras da Hospedaje Gran Avila. Com isso
não pensei muito para decidir que começaria meu passeio pela praça.
No caminho para a Plaza Bolívar constatei
novamente o que já tinha notado no dia anterior, Caracas está longe de ser uma
capital limpa, existe muito lixo pelas ruas e isso não significa que não exista
limpeza na cidade, o problema é que as pessoas ainda não tem consciência que as
vias públicas não são lixeiras e muito menos lugares para fazer suas
necessidades fisiológicas. Em determinados lugares o cheiro de urina é
totalmente lamentável.
Continuei em direção à praça e me
deparei com a estação do metrô Capitólio. Sim, Caracas tem esse meio de
transporte. Eu ainda não tive oportunidade de conhecer suas instalações, mas a
informação que eu tenho é que as mesmas são equiparadas àquelas dos países
considerados de primeiro mundo. Ainda comprovarei se isso procede ou não.
O nome da estação do metrô
indicava que eu estava próximo do Capitólio Nacional onde se concentram os
poderes executivo e legislativo da Venezuela. O prédio do século XIX ocupa todo
um quarteirão e sem dúvida é um dos mais bonitos da América do Sul.
Capitólio Nacional.
Capitólio Nacional.
Capitólio Nacional.
Publicidade colocada recentemente em toda a região central.
Publicidade ao redor do Capitólio Nacional.
Palácio Municipal de Caracas - Sede da Prefeitura.
In foco.
Praticamente ao lado do Capitólio
está a famosa Plaza Bolívar que tem a estátua do libertador que cede nome ao
lugar. É outra área bonita e bastante agradável da cidade. Ajuda a melhorar, um
pouco, a imagem da capital. Ao lado a catedral apresenta toda sua simplicidade
e a arquitetura quase não chama atenção de quem gosta de observar os detalhes
dos templos religiosos.
Plaza Simón Bolívar
Plaza Simón Bolívar
Plaza Simón Bolívar
Fui andar mais um pouco para ver
o que encontrava e deparei-me com o Palacio de las Academias que começou a ser
construído ainda no século XVI para abrigar os monges franciscanos. O lugar
passou por algumas transformações e no inicio do século XIX deixou de pertencer
a esta ordem religiosa e desde então vem sendo utilizado por diversos setores
da sociedade. Atualmente uma das áreas é ocupada pela Biblioteca Metropolitana.
É uma das construções antigas mais atraentes da capital.
Corte Suprema de Justiça.
Palacio de las Academias
Palacio de las Academias
Iglesia San Francisco, local onde Simón Bolívar recebeu o título de Libertador.
In foco.
Eu fiquei um pouco perdido para
me localizar em algumas ruas do centro. Elas têm umas denominações estranhas
que não raramente se modificam e logo depois retornam com a mesma nomenclatura.
Isso dificultou a minha orientação pelo mapa da cidade. Como eu pretendia
chegar à casa onde Simón Bolívar nasceu, simplesmente comecei a caminhar
pelas redondezas até que em um momento, sem querer, estava diante do local
desejado.
Casa natal de Simón Bolívar.
In foco.
O acesso ao interior da casa
natal de Bolívar estava fechado e por isso apenas registrei sua parte externa.
Interessante foi ficar um tempo na praça San Jacinto localizada quase na
esquina da residência. O local é considerado histórico e um dos fatos mais
conhecidos se remete ao famoso pensamento de Simón Bolívar após o terremoto do
início do século XIX. Após o desastre natural ele proferiu: “Si la naturaleza
se opone, lucharemos contra ella y haremos que nos obedezca”. Não é por menos
que o cara é idolatrado em vários países sul-americanos.
Relógio de Sol na Plaza San Jacinto.
Relógio de Sol na Plaza San Jacinto.
Tem que ser muito audacioso para proferir palavras deste tipo.
Quando voltei a caminhar eu
descobri que a casa natal de Bolívar ficava a uma quadra da praça que também leva
seu nome. Fiquei mais um tempo no simpático local e observando as árvores
verifiquei vários esquilos, chamados aqui de ardillas, eles são inúmeros e muito provavelmente permanecem na
praça em razão da alimentação oferecida pelas pessoas. De qualquer forma vale a
pena observar o movimento rápido e toda agilidade destes animais.
Ardillas en la Plaza Bolívar.
Ardillas en la Plaza Bolívar.
Ardillas en la Plaza Bolívar.
Ardillas en la Plaza Bolívar.
Pessoal jogando dominó em uma das praças da região central.
Iglesia de Santa Capilla
Já estava quase na hora do almoço
quando eu resolvi voltar para a hospedagem. Para variar a minha fome já era
enorme. Achei um restaurante no caminho e almocei somente para não emagrecer
ainda mais. Porque é triste pagar 20-30 reais em um prato de comida. Por isso
repito; maldita cotação!
No retorno ao hotel eu presenciei
um trânsito muito mais enfurecido do que nas primeiras horas da manhã. Também
identifiquei algumas práticas inacreditáveis que infelizmente também havia verificado
no dia anterior. Muitos motoristas aqui não respeitam o semáforo, a faixa de
pedestre e muito menos o próprio pedestre. Passei por países com o trânsito
bastante complicado, como Bolívia e Peru, mas nada se compara à realidade das
ruas da capital venezuelana. Tenso, muito tenso!
Finalmente na hospedagem eu
comecei a escrever o diário de bordo.
28/01/2013 - 204° dia - Caracas
(Folga)
Dia dedicado exclusivamente à
atualização do diário de bordo.
29/01/2013 - 205° dia - Caracas
(Folga)
Dia dedicado exclusivamente à
atualização do diário de bordo.
Hoje vale destacar duas coisas.
Apareceu um sinal wifi que estava sem senha e finalmente consegui acesso à internet,
todavia, a instabilidade da conexão era frequente e por vezes demorou vários
minutos para ser restabelecida. Pelo menos consegui verificar meu e-mail e
mandar notícias.
Com a internet eu finalmente contatei
o amigo André Miranda que é o autor da espiriteira Super Tuna. Perguntei os
motivos pelos quais o meu fogareiro manual não funcionou, contudo, não identificamos o
problema, mas o André teve uma idéia que poderia resolver a questão. Para
quem não se lembra, em Maracaibo eu fui testar a espiriteira, mas o fogo sempre
apagava quando eu colocava a panela sobre a peça. O que o camarada Miranda
sugeriu foi colocar um suporte para que a panela não encostasse na Super Tuna e
consequentemente deixasse o fogo aceso. A questão passou a ser como fazer tal
suporte? Gambiarra!
Pensei, pensei e pensei mais um
pouco em como fazer um suporte para que a espiriteira funcionasse. A solução
foi a seguinte. Peguei o protetor de vento para fogareiro que eu ganhei das
cicloturistas holandesas em Pisco/Peru e decidi que ele seria o suporte para
a panela, entretanto, eu deveria encontrar alguma coisa para formar a base da
espiriteira e ela deveria ser alta em razão do tamanho do
“corta-vento”. Para isso utilizei o que tinha à disposição; copo de extrato
de tomate, lata de atum, pote de plástico e uma tampa de copo de geléia. O
resultado foi fantástico.
O suporte para a panela.
A base para a espiriteira. Foi tudo no improviso, mas funcionou.
A panela ficou bem próxima da
espiriteira deixando apenas um pequeno espaço entre elas. Foi suficiente para a
entrada de ar alimentar o fogo que rendeu mais do que o imaginado com o álcool.
Em poucos minutos a água ferveu e logo na sequencia o macarrão estava cozido e
a minha barriga cheia. Sem dúvida os próximos dias minha refeição será à base
de massa e sardinha. Valeu pela dica, André.
30/01/2013 - 206° dia - Caracas
(Folga)
Dia dedicado exclusivamente à
atualização do diário de bordo.
Aproveitei o dia para procurar uma lavanderia porque minhas roupas, sobretudo, de ciclismo, estavam em um estado critico. Precisei caminhar bastante para encontrar tal estabelecimento e no local eu fui surpreendido por algumas questões.
A lavanderia era quase naquele estilo norte-americano que a gente conhece pelos filmes, onde você mesmo coloca as roupas na máquina e aguarda a mesma realizar todo o processo de lavagem e secagem. A diferença nesta lavanderia é que havia duas mulheres que cuidavam do local e eram responsáveis pelo funcionamento dos equipamentos.
O preço não estava fixado por peça e sim por lavagem. Esta é sem dúvida uma opção mais econômica. Precisei desembolsar 20 bolívares para colocar as roupas na máquina e esperar mais trinta minutos para completar o processo. Tudo simples e fácil. As vestimentas sairam limpas, cheirosas e consequentemente foram levadas para o hotel e estendidas em um pequeno varal improvisado no interior do quarto. Mais uma questão resolvida.
A lavanderia era quase naquele estilo norte-americano que a gente conhece pelos filmes, onde você mesmo coloca as roupas na máquina e aguarda a mesma realizar todo o processo de lavagem e secagem. A diferença nesta lavanderia é que havia duas mulheres que cuidavam do local e eram responsáveis pelo funcionamento dos equipamentos.
O preço não estava fixado por peça e sim por lavagem. Esta é sem dúvida uma opção mais econômica. Precisei desembolsar 20 bolívares para colocar as roupas na máquina e esperar mais trinta minutos para completar o processo. Tudo simples e fácil. As vestimentas sairam limpas, cheirosas e consequentemente foram levadas para o hotel e estendidas em um pequeno varal improvisado no interior do quarto. Mais uma questão resolvida.
31/01/2013 - 207° dia - Caracas
(Folga)
Dia dedicado exclusivamente à
atualização do diário de bordo.
Hoje eu resolvi cortar o cabelo e a barba. No salão de beleza a cabeleleira cobrou 30 bolívares para passar a máquina zero em todos os pêlos da cara e os fios do cabelo. Voltei novamente aos meus 27 anos.
01/02/2013 - 208° dia - Caracas (Folga)
Do inferno ao paraíso.
Minha amiga Erika chegou hoje na capital venezuelana. Fui busca-la no Aeropuerto Internacional Simón Bolívar que fica no municipio de Maiquetía, 26 km de Caracas. Para chegar a este local eu precisei me deslocar primeiro até a região do Parque Central, ponto onde encontrei com o Juan e a Ana Maria no meu primeiro dia aqui na cidade.
Eu precisava ir ao Parque Central porque era de lá que partiam os ônibus para o aeroporto. Da hospedagem Gran Avila até esta região do parque eu cogitei pegar um moto-taxi, mas o motociclista cobrou 50 bolívares ao identifcar que eu era estrangeiro. Um absurdo! Como estava no centro e próximo de uma estação do metrô, achei que seria uma alternativa interessante para chegar ao destino em questão.
Pegar o metrô foi uma excelente decisão. A passagem custa somente 1,50 bolívar, extremamente barato em qualquer cotação, para se locomover por toda a cidade. O funcionamento não se diferencia de outras cidades que possuem este meio de transporte. Mas vale destacar que o ambiente é bastante conservado e principalmente limpo. O sistema em Caracas conta com cinco, seis linhas, se eu não me engano. Eu precisei apenas avançar três estações para chegar ao local desejado.
No Parque Central eu encontrei facilmente a empresa que faz o transporte entre o centro de Caracas e o aeroporto. A passagem custa 30 bolívares e as saídas acontecem a cada 30 minutos. Embarquei em uma van que levou apenas meia hora para completar o trajeto. Cheguei em Maiquetía antes do avião aterrissar. Maravilha!
O aeroporto Simón Bolívar não é muito grande, mas aparentemente pareceu organizado e funcionando sem maiores problemas. Existem dois prédios que separam os voos nacionais e internacionais, me encaminhei para este último já que eu aguardava um voo procedente do Panamá.
Neste prédio internacional do aeroporto eu constatei que o voo tinha chegado antes do previsto, contudo, não encontrei quem procurava na área de desembarque. Enquanto aguardava, fiquei de olho para ver se localizava algum cambista para trocar os dólares que a Erika estava trazendo. Fui conversar com um funcionário, responsável pelo transporte das bagagens, a respeito de quem realizava a troca das moedas. Para a minha sorte ele mesmo fazia o câmbio. A cotação era excelente; 1 dólar equivalente a 16 bolívares. Perfeito.
Minha amiga não demorou a aparecer na área de desembarque e finalmente encontrei uma pessoa conhecida depois de tantos meses. Também voltei a falar português e fui literalmente salvo daquela exploração cambial. Trocamos certa quantia de dólares e saimos do aeroporto com alguns bolívares. Eu custava a acreditar que minha fase de maior dificuldade havia terminado. Agora meu dinheiro voltava a render e 1 real passou a valer 7,40 bolívares, nada comparado com a cotação anterior que fazia a moeda brasileira valer apenas 2 bolívares.
Em relação à troca de moedas no mercado negro, vale destacar os cuidados que foram tomados. Não realizamos o câmbio com qualquer pessoa. Era um funcionário do aeroporto ou empresa tercerizada, não sei, mas que estava devidamente uniformizado, inclusive, com seu nome estampado na camisa. Como ele mesmo disse, não comprometeria anos de trabalho por uma eventual troca de moedas falsas. Isso porque eu perguntei na cara dura a respeito da veracidade das notas. O câmbio aconteceu dentro de uma cabine telefonica ainda no saguão do aeroporto. Exibir dinheiro em público está longe de ser uma decisão inteligente.
Para retornar à Caracas pegamos um ônibus da mesma empresa que me levou ao aeroporto. O preço foi o mesmo. A diferença é que antes de retornar ao Parque Central o veículo passou na Plaza Miranda que era próxima de onde eu estava hospedado. Acontece que a Hospedaje Gran Avila não recebia mulheres e por isso começamos a buscar outra hospedagem. Foi uma verdadeira batalha porque existe uma coisa muito bizarra na capital. Em deteminados dias da semana os hotéis são utilizados como motéis e por isso não encontramos quarto disponível nos vários estabelecimentos pesquisados.
Depois de tanta procura, finalmente encontramos um lugar satisfatório. No Hotel Madison a diária para cada um ficou em torno de 15 reais com a nova cotação. Apenas para efeito de comparação, na cotação oficial a diária mais barata havia sido de 35 reais. É realmente muita diferença. Portanto fica a dica, se vieres para a Venezuela não deixe de trazer dólar americano para cambiar no tal mercado negro. Esqueça casa de câmbios ou saque em caixas eletrônicos, ambas as opções funcionam pelo câmbio oficial que desvaloriza totalmente a moeda brasileira.
O Hotel Madison, apesar de ficar em uma movimentada avenida, pareceu ser uma boa opção, quarto com ar-condicionado, geladeira, pia e banheiro privado com água caliente. Acho que eu não tomava banho com água quente a mais de dois meses. De qualquer forma, fica a recomendação.
Agora eu tinha que resolver mais uma questão, onde deixar a Victoria enquanto Erika e eu visitamos as praias da região. Havia combinado com a Ana Maria que a bicicleta ficaria em sua casa em Valência. Ela chegaria amanhã na capital e voltaria (com a bicicleta) no mesmo dia para a sua cidade, mas compromissos de última hora fizeram ela mudar os planos e deixar de passar em Caracas. Eu tinha que encontrar uma outra opção de confiança. Fiquei de resolver isso no dia seguinte.
02/02/2013 - 209° dia - Caracas (Folga)
Hoje aproveitamos que estávamos no centro e fomos caminhar pela região. Na verdade fui apresentar as partes mais agradáveis da cidade para a Erika. Lugares que eu havia conhecido nos dias anteriores. A novidade foi a visita ao Museu Bolivariano que apresenta algumas passagens da vida de Bolívar e fatos históricos de Caracas. O local fica ao lado da casa natal de Simón Bolívar e a entrada é gratuita.
Em relação à bicicleta a solução finalmente foi encontrada. Consegui contatar o membro do warmshowers que antes da minha chegada à capital se propusera a guardar a Victoria. Ele me pareceu ser de bastante confiança a partir dos comentários de outros cicloturistas que tiveram contato com ele. Deixamos combinado que ele passaria no hotel no dia seguinte e levaria a bicicleta para a sua oficina. Isso significava que eu não precisaria me locomover pelo trânsito enfurecido de Caracas. Questão resolvida!
03/02/2013 - 210° dia - Caracas (Folga)
Hoje o dia foi reservado para duas coisas, deixar a minha companheira fiel com uma pessoa de confiança e ir à rodoviária para reservar as passagens para Coro. Resolvemos iniciar nosso passeio no caribe pela cidade com o centro histórico mais bem preservado da Venezuela.
Na parte da manhã pegamos o metrô cuja passagem na nova cotação passou a ser R$ 0,20, muito barata. A cidade tem dois terminais de ônibus, nos direcionamos ao La Bandeira que é responsável pelas viagens para a área ocidental do país. O deslocamento foi bem fácil e rapidamente chegamos à rodoviária, contudo, para a nossa surpresa, as empresas não reservam passagens, elas só podem ser adquiridas no mesmo dia. Aproveitamos para ver os horários e preços.
Na volta para a hospedagem aguardamos o senhor que buscaria a Victoria, haviamos combinado às 15 horas, mas com alguns contratempos da parte dele, ficou marcado que passaria no hotel no período da noite. Acontece que ficamos na espera e ele não apareceu. A questão de onde deixar a bicicleta voltou a matutar em nossas cabeças. Em todo caso fiquei de ligar para esse mesmo contato na manhã do dia seguinte e saber o que tinha acontecido.
04/02/2013 - 211° dia - Caracas (Folga)
Hoje finalmente aconteceu a nossa partida da capital venezuelana.
Nas primeiras horas do dia eu liguei para o membro do warmshowers e ele se desculpou por não poder buscar a Victoria conforme havíamos combinado, no entanto, se prontificou a aparecer em questão de uma hora no hotel. Desta vez não teve nenhum contratempo e a Victoria foi entregue a uma pessoa de confiança. No caso, o senhor que se dispôs a me ajudar, também é ciclista e possui uma bicicletaria bastante conceituada na cidade. Ele me passou todos seus dados e disse que a bicicleta poderia permanecer na sua oficina pelo tempo necessário. Agradeci imensamente sua colaboração.
A diária no hotel expirou às 13 horas e na sequencia nos direcionamos à rodoviária onde o ônibus para Coro sairia apenas às 18h30m. A antecedência se fez necessária para garantir as passagens. Mas para a nossa felicidade conseguimos adquirir as poltronas sem maiores dificuldades. Cada bilhete custou 130 bolívares, equivalente a 25 reais. O tempo estimado de viagem é de 6 horas. Desta forma, nossa chegada à Coro deve ser por volta da meia-noite.
Como a chegada ao nosso destino aconteceria durante a madrugada, não hesitamos em ligar à uma pousada para solicitar a reserva.
Com tudo isso, eu começo oficialmente meu período de descanso. Devemos permanecer até o final do mês pelas praias da região. Neste período a atualização do site deve ocorrer semanalmente com todas as informações sobre os locais visitados.
E novamente quero agradecer àqueles cujo o apoio tem sido fundamental para o avanço da expedição. Muito obrigado.
Grande abraço a todos.
"Hasta la Victoria Siempre"
01/02/2013 - 208° dia - Caracas (Folga)
Do inferno ao paraíso.
Minha amiga Erika chegou hoje na capital venezuelana. Fui busca-la no Aeropuerto Internacional Simón Bolívar que fica no municipio de Maiquetía, 26 km de Caracas. Para chegar a este local eu precisei me deslocar primeiro até a região do Parque Central, ponto onde encontrei com o Juan e a Ana Maria no meu primeiro dia aqui na cidade.
Eu precisava ir ao Parque Central porque era de lá que partiam os ônibus para o aeroporto. Da hospedagem Gran Avila até esta região do parque eu cogitei pegar um moto-taxi, mas o motociclista cobrou 50 bolívares ao identifcar que eu era estrangeiro. Um absurdo! Como estava no centro e próximo de uma estação do metrô, achei que seria uma alternativa interessante para chegar ao destino em questão.
Pegar o metrô foi uma excelente decisão. A passagem custa somente 1,50 bolívar, extremamente barato em qualquer cotação, para se locomover por toda a cidade. O funcionamento não se diferencia de outras cidades que possuem este meio de transporte. Mas vale destacar que o ambiente é bastante conservado e principalmente limpo. O sistema em Caracas conta com cinco, seis linhas, se eu não me engano. Eu precisei apenas avançar três estações para chegar ao local desejado.
No Parque Central eu encontrei facilmente a empresa que faz o transporte entre o centro de Caracas e o aeroporto. A passagem custa 30 bolívares e as saídas acontecem a cada 30 minutos. Embarquei em uma van que levou apenas meia hora para completar o trajeto. Cheguei em Maiquetía antes do avião aterrissar. Maravilha!
O aeroporto Simón Bolívar não é muito grande, mas aparentemente pareceu organizado e funcionando sem maiores problemas. Existem dois prédios que separam os voos nacionais e internacionais, me encaminhei para este último já que eu aguardava um voo procedente do Panamá.
Neste prédio internacional do aeroporto eu constatei que o voo tinha chegado antes do previsto, contudo, não encontrei quem procurava na área de desembarque. Enquanto aguardava, fiquei de olho para ver se localizava algum cambista para trocar os dólares que a Erika estava trazendo. Fui conversar com um funcionário, responsável pelo transporte das bagagens, a respeito de quem realizava a troca das moedas. Para a minha sorte ele mesmo fazia o câmbio. A cotação era excelente; 1 dólar equivalente a 16 bolívares. Perfeito.
Minha amiga não demorou a aparecer na área de desembarque e finalmente encontrei uma pessoa conhecida depois de tantos meses. Também voltei a falar português e fui literalmente salvo daquela exploração cambial. Trocamos certa quantia de dólares e saimos do aeroporto com alguns bolívares. Eu custava a acreditar que minha fase de maior dificuldade havia terminado. Agora meu dinheiro voltava a render e 1 real passou a valer 7,40 bolívares, nada comparado com a cotação anterior que fazia a moeda brasileira valer apenas 2 bolívares.
Em relação à troca de moedas no mercado negro, vale destacar os cuidados que foram tomados. Não realizamos o câmbio com qualquer pessoa. Era um funcionário do aeroporto ou empresa tercerizada, não sei, mas que estava devidamente uniformizado, inclusive, com seu nome estampado na camisa. Como ele mesmo disse, não comprometeria anos de trabalho por uma eventual troca de moedas falsas. Isso porque eu perguntei na cara dura a respeito da veracidade das notas. O câmbio aconteceu dentro de uma cabine telefonica ainda no saguão do aeroporto. Exibir dinheiro em público está longe de ser uma decisão inteligente.
Para retornar à Caracas pegamos um ônibus da mesma empresa que me levou ao aeroporto. O preço foi o mesmo. A diferença é que antes de retornar ao Parque Central o veículo passou na Plaza Miranda que era próxima de onde eu estava hospedado. Acontece que a Hospedaje Gran Avila não recebia mulheres e por isso começamos a buscar outra hospedagem. Foi uma verdadeira batalha porque existe uma coisa muito bizarra na capital. Em deteminados dias da semana os hotéis são utilizados como motéis e por isso não encontramos quarto disponível nos vários estabelecimentos pesquisados.
Depois de tanta procura, finalmente encontramos um lugar satisfatório. No Hotel Madison a diária para cada um ficou em torno de 15 reais com a nova cotação. Apenas para efeito de comparação, na cotação oficial a diária mais barata havia sido de 35 reais. É realmente muita diferença. Portanto fica a dica, se vieres para a Venezuela não deixe de trazer dólar americano para cambiar no tal mercado negro. Esqueça casa de câmbios ou saque em caixas eletrônicos, ambas as opções funcionam pelo câmbio oficial que desvaloriza totalmente a moeda brasileira.
O Hotel Madison, apesar de ficar em uma movimentada avenida, pareceu ser uma boa opção, quarto com ar-condicionado, geladeira, pia e banheiro privado com água caliente. Acho que eu não tomava banho com água quente a mais de dois meses. De qualquer forma, fica a recomendação.
Imagem de uma parte do centro da capital. Fotografia tirada da janela do Hotel Madison.
Descobrimos que o Homem-Aranha vive no centro de Caracas. Está protegendo a capital até a volta do Hugo Chávez.
Agora eu tinha que resolver mais uma questão, onde deixar a Victoria enquanto Erika e eu visitamos as praias da região. Havia combinado com a Ana Maria que a bicicleta ficaria em sua casa em Valência. Ela chegaria amanhã na capital e voltaria (com a bicicleta) no mesmo dia para a sua cidade, mas compromissos de última hora fizeram ela mudar os planos e deixar de passar em Caracas. Eu tinha que encontrar uma outra opção de confiança. Fiquei de resolver isso no dia seguinte.
02/02/2013 - 209° dia - Caracas (Folga)
Hoje aproveitamos que estávamos no centro e fomos caminhar pela região. Na verdade fui apresentar as partes mais agradáveis da cidade para a Erika. Lugares que eu havia conhecido nos dias anteriores. A novidade foi a visita ao Museu Bolivariano que apresenta algumas passagens da vida de Bolívar e fatos históricos de Caracas. O local fica ao lado da casa natal de Simón Bolívar e a entrada é gratuita.
Em relação à bicicleta a solução finalmente foi encontrada. Consegui contatar o membro do warmshowers que antes da minha chegada à capital se propusera a guardar a Victoria. Ele me pareceu ser de bastante confiança a partir dos comentários de outros cicloturistas que tiveram contato com ele. Deixamos combinado que ele passaria no hotel no dia seguinte e levaria a bicicleta para a sua oficina. Isso significava que eu não precisaria me locomover pelo trânsito enfurecido de Caracas. Questão resolvida!
03/02/2013 - 210° dia - Caracas (Folga)
Hoje o dia foi reservado para duas coisas, deixar a minha companheira fiel com uma pessoa de confiança e ir à rodoviária para reservar as passagens para Coro. Resolvemos iniciar nosso passeio no caribe pela cidade com o centro histórico mais bem preservado da Venezuela.
Na parte da manhã pegamos o metrô cuja passagem na nova cotação passou a ser R$ 0,20, muito barata. A cidade tem dois terminais de ônibus, nos direcionamos ao La Bandeira que é responsável pelas viagens para a área ocidental do país. O deslocamento foi bem fácil e rapidamente chegamos à rodoviária, contudo, para a nossa surpresa, as empresas não reservam passagens, elas só podem ser adquiridas no mesmo dia. Aproveitamos para ver os horários e preços.
Na volta para a hospedagem aguardamos o senhor que buscaria a Victoria, haviamos combinado às 15 horas, mas com alguns contratempos da parte dele, ficou marcado que passaria no hotel no período da noite. Acontece que ficamos na espera e ele não apareceu. A questão de onde deixar a bicicleta voltou a matutar em nossas cabeças. Em todo caso fiquei de ligar para esse mesmo contato na manhã do dia seguinte e saber o que tinha acontecido.
04/02/2013 - 211° dia - Caracas (Folga)
Hoje finalmente aconteceu a nossa partida da capital venezuelana.
Nas primeiras horas do dia eu liguei para o membro do warmshowers e ele se desculpou por não poder buscar a Victoria conforme havíamos combinado, no entanto, se prontificou a aparecer em questão de uma hora no hotel. Desta vez não teve nenhum contratempo e a Victoria foi entregue a uma pessoa de confiança. No caso, o senhor que se dispôs a me ajudar, também é ciclista e possui uma bicicletaria bastante conceituada na cidade. Ele me passou todos seus dados e disse que a bicicleta poderia permanecer na sua oficina pelo tempo necessário. Agradeci imensamente sua colaboração.
Hasta luego, Victoria.
A diária no hotel expirou às 13 horas e na sequencia nos direcionamos à rodoviária onde o ônibus para Coro sairia apenas às 18h30m. A antecedência se fez necessária para garantir as passagens. Mas para a nossa felicidade conseguimos adquirir as poltronas sem maiores dificuldades. Cada bilhete custou 130 bolívares, equivalente a 25 reais. O tempo estimado de viagem é de 6 horas. Desta forma, nossa chegada à Coro deve ser por volta da meia-noite.
Como a chegada ao nosso destino aconteceria durante a madrugada, não hesitamos em ligar à uma pousada para solicitar a reserva.
Com tudo isso, eu começo oficialmente meu período de descanso. Devemos permanecer até o final do mês pelas praias da região. Neste período a atualização do site deve ocorrer semanalmente com todas as informações sobre os locais visitados.
E novamente quero agradecer àqueles cujo o apoio tem sido fundamental para o avanço da expedição. Muito obrigado.
Grande abraço a todos.
"Hasta la Victoria Siempre"